Produtividade da pecuária brasileira aumentou 150% nas últimas três décadas e área ocupada reduziu 16%; dados ainda não mostram realidade
Por Maurício Palma Nogueira* – Nos últimos 30 anos, a pecuária de corte brasileira aumentou a produtividade em quase 150%, mais do que dobrando a produção de carne em uma área de pastagens cerca de 16% menor. Já em relação ao rebanho e ocupação por área, a elevação foi menor, em torno de 13% e 34%, respectivamente. Os números foram obtidos a partir de dados da Pesquisa Pecuária trimestral e histórico dos censos agropecuários, ambos do IBGE.
A produtividade aumenta em ritmo maior do que a lotação – ou ocupação por área – mensurada em cabeças por hectare ou em unidade(s) animal por hectare. Uma unidade animal equivale a 450 quilogramas de peso vivo. Sendo assim, uma vaca está mais próxima do valor de uma unidade animal do que os bezerros que, em média, pesam cerca de 180 quilogramas na desmama (média entre machos e fêmeas). Serão necessários 2,5 bezerros para atingir uma unidade animal.
Essa explicação torna-se necessária pela quantidade de estudos publicados sem o devido cuidado em considerar a dinâmica do rebanho. Como temos alertado exaustivamente, faltam especialistas em produção pecuária na composição das diversas equipes que se debruçam sobre estatísticas e imagens georreferenciadas com o objetivo de diagnosticar e projetar o impacto da pecuária. Em grande parte dos casos, as conclusões acabam sendo equivocadas.
Essa é a razão pela qual alguns pesquisadores negam um dos acontecimentos mais impactantes do ponto de vista da sustentabilidade. O desenvolvimento tecnológico da pecuária a partir dos anos 1990 foi suficiente para evitar o desmatamento de 270 milhões de hectares. Chega-se a esse número calculando a área necessária para produzir a mesma quantidade atual de carne com o nível de produtividade de 1990.
E os ganhos vão além. O balanço entre área regenerada e desmatada soma outros 30 milhões de hectares no saldo positivo da pecuária de corte. Reconhecer e compreender tais números é essencial para que decisões incorretas não sejam implementadas.
O processo de intensificação não segue um pacote padrão adotado em todas as propriedades. Genética, nutrição, reprodução e sanidade impactarão consideravelmente a composição do rebanho, alterando a relação entre animais adultos e animais jovens e, consequentemente, animais de maior e menor peso.
Em outras palavras, a quantidade de unidades animal para a mesma quantidade de cabeças varia entre uma realidade e outra. Além do perfil tecnológico, é preciso considerar a atividade à qual a fazenda se dedica. Ciclo completo, recria e engorda, cria ou atividades híbridas também impactarão na composição do rebanho e na relação entre unidades animal e número de cabeças. Como não existem dados de peso dos bovinos, a dificuldade em relacionar cabeças e unidades animais será ainda maior.
E mesmo que fosse possível estabelecer tal relação de maneira confiável, ainda assim as conclusões seriam parcialmente corretas, visto que lotação ou ocupação são indicadores de estoques e não de produtividade.
Fazendas com o mesmo número de cabeças e unidades animal podem diferir completamente em termos de produtividade. Estudos que não consideram tais particularidades são incapazes de perceber o avanço da pecuária brasileira.
Além de errarem no diagnóstico, errarão também nas recomendações. Projeções, identificação de áreas degradadas e quantificação de áreas de pastagens obtidas por base no número de cabeças estarão comprometidas.
Os resultados – mais próximos de estimativas – não podem ser apresentados como obtidos pelo método científico. Ainda mais diante da disponibilidade de informações a partir de cruzamentos de fontes oficiais como IBGE, Conab, INPE, MAPA etc.
A diferença entre a evolução dos estoques e da produtividade na pecuária a partir de 1990 é enorme, da ordem de 1 para 4,5. Não pode ser negligenciada, mas continua sendo, apesar dos recorrentes alertas. Constantemente alimentada por informações mal interpretadas, a sociedade acaba ignorando essa realidade.
Apesar de silenciosa para o cidadão urbano, no campo a revolução tecnológica é barulhenta. Barulhenta e assustadora, potencializando riscos aos produtores que não conseguirem se adaptar.
Maurício Palma Nogueira é engenheiro agrônomo, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária.
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