A inovação do agro e seu protagonismo no combate às mudanças climáticas

Parte da solução do combate às mudanças climáticas e o aumento da demanda por alimentos, visto muitas vezes como parte do problema, é o AGRO

Por Ariadne Caballero e Juliana De Podestá* – Quando falamos dos desafios atuais nos deparamos com dois principais que são complementares, mas muitas vezes vistos como antagônicos: o combate às mudanças climáticas e o aumento da demanda por alimentos. Nesse contexto, damos de encontro com um setor que é parte da solução, mas que muitas vezes é visto como parte do problema: o Agro.

Diferente do que muitos pensam, o agronegócio evoluiu muito nas últimas décadas e essa evolução acelerou com a colaboração das AgFoodTechs. Através da inovação, 6 grandes tendências estão ajudando a reposicionar o setor e destravando seu potencial para virar o jogo: Tecnologia no campo, alternativas biológicas, acesso à crédito, cadeias mais eficientes, combate ao desperdício de alimento e mercado de carbono.

Além dos tão falados drones, o agronegócio e a cadeia de alimentos já estão repletos de inovações tecnológicas que tem melhorado a vida dos produtores, permitindo um aumento de produtividade e elevando a gestão a um novo patamar.

rally da safra - soja brasileira - fotao
Foto: Rally da Safra

Os sistemas de gestão em si são um exemplo claro da forma como a tecnologia já está presente no setor. Através de modelos SaaS (software as a service), esses sistemas têm ganhado cada vez mais relevância e expandindo a sua presença na operação dos pequenos e médios produtores, o que permite que sejam mais eficientes, reduzam desperdícios e aumentem sua produtividade. As startups que oferecem tecnologias de gestão já representam mais de 24% das Agtechs no Brasil que atuam “dentro da porteira”, apresentando as maiores taxas de adoção pelos produtores.

Os Saas, entretanto, vão além dos sistemas de gestão. As agtechs têm oferecido um conjunto de serviços e ferramentas que permitem que o produtor otimize as rotas durante a safra, implemente agricultura de precisão e até mesmo tenha acesso a análises de solo à distância. Através dessas e outras novas tecnologias, o aumento da produtividade é alcançado sem a necessidade de novas áreas e é acompanhado de uma redução do uso de insumos, resultando assim em uma agricultura mais sustentável e com menores emissões.

Exemplos de empresa que estão endereçando esse desafio: Aegro, Verge e Leaf

Aplicação inicial com biofungicidas, ainda no vegetativo da soja, visando a proteção inicial das plantas - Projeto Biológicos no CAD Oeste da Fundação MT
Foto: Divulgação

Alternativas biológicas

Em conjunto com a redução do uso de fertilizantes e químicos e aumento de eficiência, surgem os insumos alternativos. Em uma era onde buscamos produtividade em paralelo a conservação do solo, água e biodiversidade, os insumos biológicos ganham força. Em 2021, segundo o Radar Agtech 2022, essa categoria levantou US$ 2,6 bilhões, um crescimento de mais de 30% no volume investido frente ao ano anterior.

Indo de encontro aos químicos que historicamente fazem parte do agro, os biopesticidas vem sendo uma solução inovadora e eficaz no combate às pragas junto aos pequenos, médios e grandes produtores. Através da substituição, mesmo que parcial dos químicos, o setor reduz significativamente seus impactos negativos potenciais, eliminando o risco de contaminação de solo e água e, muitas vezes, colaborando com a resiliência climática.

Junto dos biológicos que atuam como alternativas, o setor tem visto um aumento de soluções complementares, como os micróbios. A inovação nessa área pode ser chave na restauração de áreas degradadas (possibilitando a produção onde antes não era possível), assim como na adaptação às mudanças climáticas e no aumento de resiliência da produção de alimentos nas próximas décadas.

Exemplos de empresa que estão endereçando esse desafio: Gênica, Decoy e Punabio

Foto: Divulgação

Acesso à crédito

Tendo em vista que de nada adianta termos tecnologia e alternativas se o produtor não conseguir acessá-las, as Fintechs têm tido um papel relevante na transição do setor. O empoderamento do pequeno e médio produtor permite não só uma maior profissionalização e aumento de governança na cadeia, mas também o tão esperado aumento de produtividade e redução da pegada de carbono.

A redução da burocracia, o aumento de velocidade e a inclusão entregues a partir das fintechs tem colocado o pequeno e o médio produtor, que são tão presentes na realidade brasileira, mais próximos dos grandes players do setor. O agro é intensivo em capital de giro e as atividades devem ficar mais incertas com a intensificação dos eventos climáticos adversos. O uso de tecnologias aliadas a novos modelos de negócio é fundamental para financiar uma agricultura de forma resiliente às mudanças climáticas.

Alcançar novos patamares de eficiência e produtividade através do uso de tecnologia, de insumos alternativos e de maior inteligência no campo é essencial para suprir as demandas futura e garantir um agro mais sustentável

Colaborando com essas melhores práticas no campo e com o alinhamento delas com critérios ESG, alcançamos maior transparência e rastreabilidade da cadeia e o aumento da resiliência do setor. Esse novo panorama com riscos reduzidos possibilita créditos mais baratos para o produtor, retroalimentando um ciclo de evolução responsável.

Exemplos de empresa que estão endereçando esse desafio: Agrolend, Traive e Verqor

Cadeias mais eficientes

Além das inovações no campo e na vida do produtor, a evolução do setor se expande por toda sua cadeia. A busca por cadeias eficientes e mais curtas se intensificou ao longo dos últimos anos e o surgimento de soluções que conectam o produtor ao consumidor final tem sido chave nesse processo.

A redução e até mesmo eliminação de intermediários permite uma maior rastreabilidade dos produtos, além de reduzir as despesas logísticas e o próprio desperdício ao longo da cadeia. Como resultado dessa nova forma de operar, o consumidor final tem acesso a produtos de maior qualidade, mais acessíveis e com menor pegada de carbono.

Em conjunto com as diversas vantagens ao consumidor, a redução dos elos da cadeia ainda colabora com uma remuneração mais justa ao produtor (fair supply), empoderando também este.

Exemplos de empresa que estão endereçando esse desafio: Agrofy, E-Rural e ZoomAgri

Combate ao desperdício de alimento

Avançando mais um passo na cadeia, precisamos olhar para a temática de desperdício de alimentos. De nada adianta produzirmos mais, reduzirmos a pegada de carbono desses alimentos e não permitirmos que estes cheguem a seu destino final e que sejam parte da solução.

Atualmente nos encontramos em uma realidade onde 30% de todo o alimento produzido no mundo é desperdiçado. Além dessa problemática ir direto de encontro ao desafio de alimentar uma população cada vez maior, ele ainda tem um impacto significativo no combate às mudanças climáticas, dado que todo esse alimento desperdiçado resulta em emissões em aterros e lixões.

Buscando soluções, as FoodTechs têm ganhado força, não só desintermediando as cadeias e colaborando com a eficiência destas, mas também trazendo a tecnologia como parceira na gestão dos alimentos.

Exemplos de empresa que estão endereçando esse desafio: Frizata e Clicampo

Mercado de carbono

Junto às ações para redução de emissões, as empresas e os produtores contam com um novo mercado que tem ganhado cada vez mais força: o mercado de carbono.

Os créditos de carbono, muito discutidos atualmente, são uma parte relevante da solução ao combate às mudanças climáticas. Através da preservação, conservação, reflorestamento, captura de carbono e até eficiência de processos, é possível reduzir as concentrações de gases de efeito estufa e colaborar com os objetivos estabelecidos pelo acordo de Paris.

É importante lembrar, entretanto, que sozinho, esse mercado não é a solução. Para combater as mudanças climáticas, é preciso que trabalhemos com um conjunto de ações, incluindo a mitigação às mudanças climáticas através da redução das emissões, da eficiência em processos e investimentos em novas formas de produzir. Além disso, a busca constante por melhores práticas e o foco na resiliência e adaptação climática são essenciais.

Exemplos de empresa que estão endereçando esse desafio: Moss e goFlux

Formas de contribuição no combate às mudanças climáticas

De forma prática, as tendências descritas acima colaboram com o combate às mudanças climáticas de 3 diferentes formas:

  • Tecnologias que viabilizam a redução de emissões, contribuindo para o Net Zero
  • Tecnologias que contribuem para adaptação e resiliência climática
  • Tecnologias Carbono negativo, que capturam ou estocam carbono

A imagem abaixo apresenta diferentes empresas investidas pelo mais recente fundo da SP Ventures, o AGVII, e suas verticais de contribuição ao combate às mudanças climáticas. O portfólio da gestora comprova o potencial das Startups do agro frente aos desafios atuais e ressalta a importância do setor de investimentos na trajetória e desenvolvimento dessas novas soluções.

empresas investidas pelo mais recente fundo da SP Ventures, o AGVII, e suas verticais de contribuição ao combate às mudanças climáticas
Foto: Divulgação

Conclusão

Essas são algumas das soluções de mercado que têm ganhado força no contexto atual e que tem posicionado as AgFoodtechs como protagonistas na transição para um agro de baixo carbono e uma cadeia de alimentos mais eficiente.

Entretanto, os desafios do combate às mudanças climáticas e do aumento da demanda de alimentos estão longe de serem resolvidos. Enxergamos um mercado muito fértil para o futuro, principalmente dentro dos setores de Ag e Food, mas para garantirmos o impacto positivo e para seguirmos na direção de solucionar esses desafios, é necessário evoluir na forma de identificar, mensurar e monitorar o impacto, dando transparência destes para o mercado.

O novo reporte do S&P Global Sustainable traz dados que apontam que menos de 10% dos Fundos Climáticos estão alinhados com as Metas Globais de Descarbonização, o que enfatiza a necessidade de metodologias consistentes, comparáveis e transparentes com o mercado:

“Companies are under pressure to understand their warming trajectory and plan accordingly to decarbonize. This same analysis can be extended to equity and mutual funds, which represent trillions of dollars of investments and play an important role in the energy transition of the broader economy. Our analysis points to a systemic issue — few funds, even those that describe themselves using green or climate-specific language, are on track to meet the goal of the Paris Agreement. Understanding the trajectory is an important step toward planning for a low-carbon future.” fonte.

Dada a relevância das startups nessa jornada, os fundos de investimento e de VC tem um papel importante não só na seleção de seus investimentos, mas também de fazer parte dessa evolução, trabalhando com seus portfólios no desenvolvimento de metodologias de mensuração e garantindo a qualidade e veracidade dos dados. Essa parceria é essencial para o mercado e para o desenvolvimento dessas soluções e das que estão por vir.

*Ariadne Caballero, sócia da SP Ventures, e Juliana De Podestá, Head de ESG e Impacto da SP Ventures

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