“Nas reuniões preparatórias, o foco dos europeus reside em normas para a produção agrícola, como se os problemas climáticos fossem causados pelos agricultores, e não são…” escreve Xico Graziano.
Frente às terríveis mudanças de clima que afetam seu território, reduzir o uso de energia fóssil é a grande tarefa da União Europeia. Mas ela prefere difamar a agricultura brasileira. Foge de seus problemas nos condenando. Essa hipocrisia ambiental se percebe, por exemplo, nos bastidores da próxima COP28, a ser realizada em novembro, na Arábia Saudita. Nas reuniões preparatórias, o foco dos europeus reside em normas para a produção agrícola, como se os problemas climáticos fossem causados pelos agricultores, e não são.
Os 4 gráficos que apresentarei ao longo desse texto evidenciam a situação global sobre as emissões de GHG (greenhouse gas), ou GEE (gases de efeito estufa). De acordo com o Climate Change 2023/Synthesis Report, último relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), os setores de energia, transportes, indústria e construção civil respondem por 79% das emissões mundiais de GEE.
Considerando-se tão somente a produção de energia, 87% das emissões setoriais de GEE vem da queima de combustíveis fósseis, conforme dados do Statistical Review of World Energy para a IEA (Agência Internacional de Energia). O Brasil foi um dos poucos países a mostrar redução (4%) nas emissões de GEE do setor energético, mesmo tendo um crescimento no consumo de energia de 4,3%.
Desde 1850, até 2021, a influência dos países nas emissões cumulativas de GEE mostra o Brasil com 1,85% do total mundial. O ranking é liderado pelos EUA (21,6%), seguido de União Europeia (15,6%), China (14,1%), Rússia, Índia (4,6%) e Reino Unido (3,8%), dentre os principais emissores históricos.
Na Europa, 75,4% das emissões de GEE se originam na queima de combustível fóssil, cabendo aos demais setores a parcela de 22,8%. A agricultura europeia emite 10,7% do total.
Tomando-se só a influência do desmatamento, a chamada “mudança de uso da terra” responde por 9,6% das emissões globais de GEE. Dessas, cerca de 58% cabem à Indonésia, Brasil e República do Congo. Ou seja, só 2,2% das emissões mundiais de GEE se originam do desmatamento nacional. Em 2023, esse valor deve cair pela metade.
As evidências científicas indicam o papel central da redução das energias fósseis no combate às mudanças do clima. Por que, então, os países da União Europeia não centram suas preocupações na transição energética de suas sociedades? Há alguns dias, participei de uma reunião, realizada na Sociedade Rural Brasileira, em São Paulo, com a presença de André Corrêa do Lago. O embaixador, um dos maiores entendidos na agenda global da sustentabilidade, criticou a posição europeia nas negociações internacionais, envolvendo a COP28 e o acordo UE/Mercosul. Ficou claro que a UE se especializou no nosso problema, o desmatamento, abandonando a sua lição de casa, a transição energética. A hipocrisia europeia agrada aos países árabes, obviamente, tanto quanto à Rússia, que vende a maior parte do gás utilizado na Europa. Todos eles, incluindo a China e os EUA, parecem se divertir às nossas custas, priorizando firulas ligadas ao denominado “food system” para disfarçar sua covardia frente à questão energética.
Ora, combater a supressão criminosa de florestas é problema nosso, do Brasil e da agricultura do Brasil. Não precisamos de lição de moral. Precisamos, isso sim, unir o setor privado com o público para isolar e combater decisivamente o vergonhoso desmatamento ilegal do país.
Combater as mudanças climáticas não suporta hipocrisia. Nem desleixo.
Autor: Xico Graziano
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ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Juliana Freire sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira
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