Veja como é dirigir uma colheitadeira gigante, vídeo

Autoesporte foi até o Piauí para acompanhar safra recorde de soja, testar máquina agrícola e entender logística de distribuição de grãos.

Já era madrugada quando entramos na BR-135, no Piauí. A rodovia de pista simples, sem acostamento, ausente de radares, com asfalto precário em muitos trechos e com fluxo intenso de caminhões é conhecida pelo não amistoso apelido de “rodovia da morte”.

Mas, felizmente, o único óbito que presenciamos lá foi o atropelamento de uma cobra jiboia – o que, claro, não deixa de ser triste. Confira abaixo como é dirigir uma colheitadeira gigante, vídeo é sensacional!

Na manhã daquele mesmo dia, já em Baixa Grande do Ribeiro, a 600 km de Teresina, eu entrava em uma gigantesca máquina agrícola para acompanhar a colheita de soja na região, que bateu recorde: neste ano, os 22 mil hectares de fazenda estão com o solo mais fértil de sua história. Para fazer toda a colheita, com condições meteorológicas favoráveis, são descontados de 40 a 50 dias.

A partir dessa escolha, foi possível como funciona a logística do agronegócio e as dificuldades para encarar as péssimas e perigosas rodovias no interior do Brasil.

Confesso que quando vi mais de 20 daquelas máquinas enfileiradas em meio à imensidão das plantações fiquei arrepiado. Imediatamente corri para uma delas, fiz um sinal para o operador e gritei: “posso entrar?”. Gentilmente, ele disse que sim.

Subi os cinco degraus da escada vertical até chegar ao topo e entrar na cabine com capacidade para duas pessoas. A primeira impressão foi de algo extremamente complexo de comandar. São diversos botões por todos os cantos.

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(Foto: André Schaun)

O modelo em questão é um Case 8230 com motor 13L de 516 cv. O câmbio é automático de quatro marchas e a capacidade do tanque de combustível é de nada menos do que 1.100 litros de diesel, e registro até 2,5 km / l de consumo. O preço da máquina completa, já com a plataforma para fazer a colheita, ultrapassa os R $ 2 milhões.

Com a ignição ligada e a cabine ainda não muito barulhenta, teve que esperar um pouco para começar a colheita. Isso porque quando chove, não há possibilidade de colher soja por conta do desperdício. E a primeira foi ai que entrou a experiência de funcionalidade da máquina.

O operador me explicou que aquela enorme tela ao lado do motorista – como um computador de bordo do carro – mostra tudo que você precisa saber sobre a colheita, inclusive a umidade da soja que está sendo colhida pela máquina.

O marcador de umidade da soja estava em 6,7% quando entrei, o que é um índice ótimo, já que a média da colheita fica entre 12% e 15%. Porém, quando o solo está molhado, essa umidade obviamente aumenta, e se ultrapassar os 18% a colheita deve ser cancelada.

Isso porque quanto mais pesado ficar o solo, mais difícil será a divisão da folha e do grão na plataforma, elevando muito a taxa de desperdício. Para facilitar a colheita e aumentar a produtividade, é jogado um produto para ressecar as folhas dias antes de passar com a colheitadeira.

Um dos motivos para que não aconteça a colheita de soja no período noturno é justamente essa umidade do solo. Normalmente, como colheitas vão das 7h até o sol se pôr. Algo que não acontece na safra do milho, por exemplo, que pode ser feita durante 24h, em dois turnos.

Para que a colheita seja bem-colhida, uma máquina agrícola depende do funcionamento da plataforma, aquela ferramenta cheia de garras que fica acoplada na frente da colheitadeira; no caso do modelo que eu operei, são quase 12 metros de comprimento.

(Foto: André Schaun)

Na plataforma, há uma esteira com um rolo que joga tudo que foi colhido para uma peneira que divide as folhas dos grãos. Nessa parte do processo, acontece uma limpeza que vai jogando a palha fora e deixando os grãos separados para serem jogados em um elevador por meio de um ventilador.

Feito isso, os grãos caem em um baú localizado em um distrito atrás do motoristas. A capacidade de carga do baú é de 180 a 185 sacos, com 60 kg cada um deles. Ou seja, isso pode dar pouco mais de 11 toneladas. E, acreditem, o tempo pra encher um baú inteiro é surpreendente …

Na cabine, o operador tem controle absoluto e pode acompanhar a velocidade da plataforma, abertura das peneiras e velocidade do ventilador. Todos esses dados, e muitos outros, são eliminados na tela ao lado do motoristas. Para iniciar o trabalho, o operador me explicou como comandar tudo isso: as principais funções são feitas pelo manche, que tem cinco grupos de botões.

Os dois botões mantendo na região mais acima do manche são para abrir e fechar a bica, aquele cano responsável por jogar o que foi colhido no caminhão. O botão logo abaixo, do lado esquerdo, descarrega o que foi colhido.

Os botões do meio, por sua vez, são os que controlam a plataforma, como altura e ampla para a direita ou para a esquerda. O botão da extremidade direita comanda o corte da plataforma e o outro, da ponta esquerda, controles como posições do molinete, que é o responsável pelo transporte dos cereais até o baú.

(Foto: André Schaun)

O acelerador fica em uma alavanca do painel, enquanto o freio é no pé. Porém, os dois comandos também são controlados pelo manche durante a condução. Se colocar o manche para frente, a máquina acelera. Para trás, a máquina freia. Depois de todas as instruções, lá vou eu assumir o volante.

Para operar máquinas agrícolas, era preciso ter habilitação de categorias: C, D e E. Porém, em 2015, foi aprovado uma lei para que quem tem carteira B já pode operar essas máquinas. Há diversos cursos desenvolvidos para que os trabalhadores rurais aprendam todas as funções e normas de segurança.

A velocidade fornecida é fornecida pela posição que está colocada uma alavanca de acelerador. Se ela estiver em seu grau máximo, a velocidade total pode ser alcançada, se estiver posicionada na metade do curso, chegará a uma velocidade menor e assim sucessivamente. É como se fosse um limitador de velocidade.

O ideal é que a velocidade da máquina seja de até 5 km / h na hora da colheita, porém, é possível chegar até pouco mais de 10 km / h. Normalmente, a colheita é feita sempre na segunda marcha.

(Foto: André Schaun)

Outro detalhe importantíssimo é que a aceleração deve ser gradual e a plataforma deve ser ligada depois que o motor já estiver pelo menos 20 segundos em ação.

A aceleração e o freio são muito sensíveis pelo manche, portanto, é preciso ser bem delicado. O mesmo vale para o volante, que é muito leve e nem parece estar guiando um veículo daquele tamanho, com 16.488 kg (e para toda carga que ainda é adicionado com a colheita). Eu fiz o percurso em uma média de 4 km / h, mas a impressão é de estar mais rápido que isso.

A posição da plataforma é empunhada sempre baixa porque a soja é colhida rente a terra. Durante todo o percurso, um barulho dentro da cabine enquanto o baú é preenchido pelos grãos atrás do motorista é muito alto e mal dá para conversar.

Quando atinge uma capacidade máxima no baú, demora uns 20 minutos, é acionada uma sirene no lado de fora da colheitaitadeira para a bazuca saber que já é hora de máquina de descarga ser descarregada. Em média, um operador faz esse processo 20 vezes por dia.

A bazuca é um veículo que acompanha como máquinas e tem a função de produzir os grãos para depois encher os caminhões. Uma bazuca carrega em média 40 toneladas de grãos.

Neste caso, como havia 50 caminhões Mercedes-Benz Actros acompanhando o processo de colheita, o descarregamento foi direto na caçamba deles. Puxando um tritrem de 9 eixos, o Actros 2651 6×4 tem capacidade para 50 toneladas de soja e 74 toneladas de peso bruto com seus 26 metros de comprimento.

(Foto: André Schaun)

Na hora de despejar a soja no Actros, a parte mais difícil foi a distância que eu deveria ficar da caçamba do caminhão, já que a bica tem 7,3 metros de comprimento. Com a colheitadeira posicionada, chegou a hora de posicionar a bica até ficar totalmente em cima da caçamba.

Com o alarme autorizando a descarga dos grãos, o aperto do botão e o despejo começa junto a um barulho altíssimo e uma tremedeira na cabine da colheitadeira. Todo processo até esvaziar o baú, demora cerca de 2 minutos.

Isso foi apenas para encher um pouco mais que a metade de uma das três caçambas do Actros. É necessário fazer o processo pelo menos cinco vezes para encher a capacidade total de 50 toneladas do caminhão.

Depois do último grão que caiu na caçamba do Actros, chegou o fim da minha experiência a bordo da enorme colheitadeira no ciclo da soja. Foi desafiador, surpreendente e muito importante para entender como é o difícil cotidiano de um operador de máquinas do campo.

Mas dali para frente, é o dia a dia do caminheiro que entra em ação pela árdua missão de transporte pelo Brasil.

Esses caminhões transportam todo o volume do campo para os armazéns dentro da própria fazenda em que independente. Ali, os grãos passam por uma seleção de qualidade, e após seguir e compactados em sacos de 80 kg, são colocamos novamente dentro dos caminhões e partem para várias regiões do Brasil e para o Porto de São Luís, no Maranhão, onde são exportados.

Conversando com os motoristas de caminhão a principal queixa deles foi justamente a situação das estradas no Brasil, principalmente na região Nordeste. A BR-135 já esteve muito pior, segundo eles, mas ainda é extremamente perigosa e precária para caminhões lotados de mercadoria circulares, assim como em tantas outras BRs no Brasil.

Muitas dessas estradas têm apenas uma camada fina de asfalto sobre um terreno e não suporta o fluxo intenso de caminhões e das chuvas em algumas partes do ano, por isso são tão cheias de buracos (ou, em alguns casos, de verdadeiras crateras).

De acordo com dados divulgados pela Mercedes-Benz, se pegarmos dois caminhões, um no Brasil e outro nos Estados Unidos, e traçarmos um trajeto com a mesma distância, aqui o tempo será três vezes maior para ser completado. Um dos desafios para melhorar a produtividade do setor agro e dos demais impulsionadores da economia nacional.

Compre Rural com informações do Globo Rural

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