Item básico da alimentação dos brasileiros, produto acumula valorização de 117% no campo e já é vendido por até R$ 40 o pacote de 5 kg no varejo.
Quem foi ao supermercado nos últimos dias levou um susto: o preço do pacote de 5 kg de arroz, comprado por R$ 10 a R$ 15, disparou. Em algumas regiões, o valor cobrado pelos supermercados chegou a R$ 40 no início deste mês, e as perspectivas de queda são poucas, já que o Brasil está em entressafra e poucos produtores têm estoque do produto.
Mas, afinal, como um país que já figurou como um dos dez maiores produtores mundiais de arroz chegou ao ponto de iminente desabastecimento de um item básico da alimentação, presente na mesa de mais de 90% dos brasileiros?
Além da alta do dólar, que eleva os custos de produção no país e estimula as exportações, o cenário atual é reflexo de dez anos de redução de área plantada e queda nos estoques públicos, em seu menor nível desde 2010, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
1. Produção menor
Na última década, a área plantada no país caiu mais de 58%, passando de 2,9 milhões de hectares para 1,7 milhão de hectares em 2019/2020. No mesmo período, contudo, a produtividade nacional cresceu 59%, gerando um recuo de apenas 3% na produção.
“Realmente, a gente vem indicando que precisamos ter um sistema de produção e não depender só da monocultura do arroz. Isso vem diminuindo a oferta”, explica Alexandre Velho, presidente da Federação dos Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz), Estado que concentra 70% da produção nacional.
Ele explica que esse preço vem depois de cinco safras sucessivas com o produtor vendendo arroz abaixo do custo de produção, tendo muitas vezes prejuízo ou nenhum lucro. A situação levou produtores a diversificarem e, onde foi possível, a federação estimulou o plantio de outras culturas de maior liquidez, como a soja e o milho, associada à criação de gado.
“Já prevíamos uma mudança no patamar de preços ao produtor desde o ano passado em função da diminuição da área plantada e, justamente, dessa falta de rentabilidade e maior endividamento do setor”, completa Velho.
2. Maior consumo na pandemia
A demanda, por outro lado, registrou um forte e repentino aumento no início deste ano, quando a pandemia de Covid-19 levou ao aumento do consumo dentro de casa.
“A indústria afirma que o varejo apresentou uma demanda três vezes superior ao observado no ano passado no início da pandemia, nos meses de março e abril”, conta Guilherme Viana, analista da Safras & Mercado.
3. Estoques baixos
Os estoques públicos de arroz, segundo acompanhamento realizado pela Conab, chegaram a setembro a 606,6 toneladas, o suficiente para menos de um mês de consumo e o menor patamar para o mês desde 2010.
“Esse volume de estoque é irrisório e o que tinha no final do ano-safra passado não chegava nem a isso”, aponta Lucílio Alves, pesquisador do Cepea e professor da Esalq-USP. Há dez anos, os estoques públicos de arroz no Brasil em setembro passavam de um milhão de toneladas, mas apresentam queda desde então.
“Ao longo do tempo, o governo deixou de adquirir estoques. Atualmente, ele não tem recursos na prática para quase nada, nem para pagar salários. Com isso, o governo saiu desse processo e deixou o mercado se regular”, aponta Alves.
4. Dólar alto e exportações
No cenário macroeconômico, a redução das exportações entre os países asiáticos, maiores exportadores e consumidores mundiais, abriu espaço para alta nos preços internacionais e para que o Brasil expandisse em 73,6% suas exportações de janeiro a agosto deste ano comparado a igual período do ano passado, com 1,5 milhão de toneladas vendidas.
“A questão é que todas as commodities subiram muito nesta temporada em parte também por conta do dólar. Se o dólar estivesse nos patamares de um ano atrás, teríamos preços 40% menores não só para o arroz, mas também para soja, milho, trigo”Lucílio Alves, pesquisador do Cepea e professor da Esalq-USP
Engana-se, contudo, quem pensa que o produtor tem ganhado dinheiro com essas exportações. “O câmbio aumenta a receita do exportador gerando incentivo para a exportação, mas é importante lembrar que ela não é feita pelo produtor rural, mas pelas grandes empresas, tradings e cooperativas”, destaca o professor da Esalq-USP.
5. Baixo incentivo no campo
Segundo estimativa da Federarroz, menos de 30% dos produtores possuem estoques para aproveitar os preços recordes da entressafra enquanto os custos de produção aumentaram 10,5%, segundo dados do Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga). “A maioria vendeu a R$ 45 a saca no início da safra, poucos conseguirão alcançar uma média de R$ 70 a saca”, afirma Velho.
Diante desse cenário, a orientação da Federarroz e do Irga para a próxima temporada é de que os produtores não expandam de forma expressiva a área. “Tem muito produtor que gostaria de aumentar a área, mas estamos dizendo para não aumentar muito por dois motivos. Primeiro, ele já levou muito tombo. Segundo, sempre que aumenta demais a oferta, os preços caem”, explica o diretor técnico do Irga, Ivo Melo.
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Além das questões de mercado, a baixa disponibilidade hídrica no Estado e o elevado endividamento dos produtores são fatores que dificultam a expansão da oferta no país.
“O problema de endividamento e das margens negativas na cultura do arroz é crônico e não é simplesmente uma safra de alta que vai ajudar ele a fechar a conta 100%. Por mais que tenha aumento de preços, isso não quer dizer que a margem aumentou proporcionalmente”, observa Maciel Silva, coordenador de Produção Agrícola da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
Fonte: Globo Rural