Organizações oficiais reduzem projeções para a próxima safra do grão no país e alertam para “impactos negativos” na produção sul-americana devido às transformações climáticas.
Qualquer atividade humana está sujeita a perdas econômicas causadas por infortúnios que fogem ao controle do profissional. O dono de uma pequena padaria pode ver suas vendas caírem devido ao aumento repentino do preço do trigo. Ou um grande investidor pode perder milhões de reais em poucas horas com a notícia da descoberta de uma nova variante do coronavírus que provoque nova derrubada da bolsa de valores.
Na agricultura, a lógica é a mesma. Os produtores nunca sabem quando haverá longos períodos de estiagem ou se outros países passarão a ser mais competitivos em seu mercado em dado momento. Em todas as áreas, no entanto, é sempre importante estar preparado ao que os agricultores classificam como “fatores exógenos”, ou seja, que não dependem das escolhas dos donos do negócio.
Os produtores de soja brasileiros sabem bem disso. Por mais conhecimentos e tecnologias que possuam, sempre existirá a variável imprevisível do clima. O aumento das temperaturas globais e o prolongamento dos períodos de estiagem, causados por mudanças climáticas, têm gerado preocupações quanto ao fôlego do setor no país.
Na virada do ano, enquanto as regiões Sudeste e Nordeste já sofriam com fortes chuvas e alagamentos, a Região Sul do país vivia sob estiagem, que provocou prejuízos no setor agrícola.
O Brasil é o maior produtor de soja do mundo. Na safra 2020/21, o país colheu 135,409 milhões de toneladas do grão em uma área total de 38,502 milhões de hectares, conforme noticiou a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária).
Os Estados Unidos aparecem na sequência no segmento, tendo plantado 112,549 milhões de toneladas no mesmo período. Para efeito de comparação, a produção de todos os demais países juntos corresponde a 114,989 milhões de toneladas, volume levemente superior ao dos EUA e menor que o brasileiro.
Em relatório divulgado neste mês, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) reduziu a projeção para a safra brasileira 2021/22 de 139 milhões para 134 milhões de toneladas, em linha com as perspectivas de consultorias brasileiras, segundo publicou o Canal Rural.
Para a produção norte-americana, a USDA manteve a aposta de 120,7 milhões de toneladas.Nesta semana, diversos países analisam o relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), com previsões em áreas potencialmente afetadas pelo clima. A organização aponta que a produção de soja na América do Sul será impactada negativamente com as transformações climáticas, conforme noticiou o portal UOL.
Segundo o documento, a área cultivada no continente deverá encolher. Se as estimativas se confirmarem, a nova ordem climática mundial pode de fato derrubar a produção brasileira e trazer impactos negativos à economia do país? Para o coordenador do Laboratório do Semiárido na Universidade Federal do Ceará, José de Jesus Sousa Lemos, as potenciais perdas não serão definitivas e não prejudicarão o abastecimento do mercado no país.
“Pode haver uma pequena escassez de soja, passageira, que vai logo ser superada, porque a produção de soja é muito pujante no caso brasileiro. Então, não há essa perspectiva de haver falta de soja”, afirmou Lemos em entrevista à Sputnik Brasil.Segundo ele, se por determinado período, a produção brasileira não for capaz de suprir a demanda mundial, os EUA compensam, e vice-versa. Quem perde momentaneamente são os produtores, explicou.
“Mas a situação já deve se reverter no próximo ano ou mesmo neste ano, em que se espera uma época com chuvas”, disse o especialista.
Apesar do otimismo, Lemos reconhece que a situação é “difícil” e que o Brasil vai perder volume na balança comercial em virtude do importante papel da soja para as exportações. Porém, ele acredita na recuperação, porque o país “tem vantagem comparativa e competitiva” no setor.
“Não se pode fazer nada contra o clima, porque é determinado pela natureza. Não se pode nem prever o que vai ocorrer daqui a um ano quanto a chuvas ou a falta dela. Então, o que temos que fazer é criar uma agricultura resiliente a essas dificuldades climáticas”, indicou.
Tecnologia aliada à conscientização
Valdo Marques, vice-presidente executivo da Stemac, empresa que oferece soluções comerciais, empresariais e industriais, afirma que o momento atual ainda é crítico. Segundo ele, em locais com restrição de disponibilidade hídrica, é preciso ter eficiência para reter ao máximo a água nas propriedades rurais.
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“Captar a água da chuva que cai sobre as construções, armazenando-a em reservatórios e cisternas, é a forma mais barata e eficiente de aumentar a reserva e garantir a estabilidade produtiva”, apontou Marques em análise enviada à Sputnik Brasil. Mesmo com novas tecnologias que atenuam os efeitos climáticos, o especialista destaca a importância da produção sustentável e do uso eficiente e consciente dos recursos.
“São práticas essenciais e cada vez mais adotadas. É importante que as pessoas assumam o compromisso diário de evitar o desperdício, contribuindo para preservar água nos reservatórios e reduzindo a geração termelétrica. Só assim poderemos diminuir o custo total da produção de energia e, consequentemente, ajudar a mitigar os impactos ambientais”, ressaltou.