‘Se o Brasil reduzir as queimadas criminosas, a imagem global melhora rapidamente’, diz CEO da SLC

Para Aurélio Pavinato, diretor-presidente da SLC Agrícola, COP-30 vai ser importante, no mínimo, para mostrar ao mundo o Brasil que produz e conserva.

Engenheiro agrônomo de formação, com mestrado e doutorado em Ciência do Solo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Aurélio Pavinato tem 32 anos de SLC Agrícola. Há anos, ocupa o cargo de diretor-presidente, como ele prefere ser chamado. Nascido na Colônia de Barreiro, no interior gaúcho, local em que só havia o ensino primário, o executivo de uma das gigantes do agronegócio é otimista com o Brasil. Para resolver os gargalos do setor, segundo ele, é preciso uma única coisa: demanda. A partir disso, tudo se resolve.

Fundada em 1977 e com sede em Porto Alegre, a SLC é uma das maiores produtoras de commodities agrícolas do País. Tem cerca de 730 mil hectares de área plantada em 26 unidades de produção, localizadas em sete Estados.

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Para Pavinato, diante de um contexto em que a crise climática está dada, a COP-30, que será realizada em Belém, vai ser importante, no mínimo, para que o Brasil que produz e conserva apareça para o mundo. Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

Como a questão da sustentabilidade é tratada no dia a dia da SLC Agrícola?

A sustentabilidade está presente na nossa empresa desde a fundação. Quando comecei a trabalhar nela, em 1993, meu foco era desenvolver um sistema de manejo sustentável do solo. A preocupação era garantir que o solo melhorasse ao longo dos anos, em vez de se degradar, como ocorria na agricultura extrativista. Depois disso, ao longo do tempo, fomos evoluindo. Em 1999, começamos a trabalhar na qualidade do produto. Em 2010, iniciamos a certificação das fazendas e dos processos produtivos. Hoje, a sustentabilidade está totalmente atrelada à eficiência, pois uma empresa precisa ser sustentável e eficiente ao mesmo tempo. Se olharmos em termos de evolução da humanidade, esse conceito de produzir de forma sustentável é jovem. Em 1987 foi definido o conceito de que a produção para as gerações atuais, precisa garantir o sustento das gerações futuras, falando de uma forma resumida. Hoje, a questão ambiental, assim como a social, é uma preocupação muito presente em todas as cadeias produtivas.

Vocês atuam diretamente no Cerrado, um bioma que sempre está na berlinda quando se fala em conservação. Qual a preocupação de vocês em relação ao tema?

A empresa foi fundada no Sul, em Horizontina, Rio Grande do Sul, e vendemos a nossa fábrica de máquinas para a John Deere em 1999. Depois, migramos para o Cerrado, onde havia áreas maiores para expansão. Hoje, temos 26 fazendas em sete estados do Cerrado. Produzimos grãos como soja, milho e algodão, além de sementes de soja e algodão. Recentemente, também entramos na integração lavoura-pecuária, comprando e engordando gado. Historicamente, a expansão da produção ocorreu pela conversão de novas áreas. Mas o Brasil ainda tem dois terços da sua superfície coberta por vegetação nativa. Há um potencial enorme de conversão de pastagens degradadas em áreas produtivas. Por isso, acreditamos que a demanda por alimentos pode ser atendida sem desmatar novas áreas. As pastagens cobrem uma área ao redor de 170 milhões de hectares. Desse total, entre 30 a 40 milhões de hectares são aptos para a produção de grãos. Três quartos do aumento na oferta de alimentos ao longo dos últimos 50 anos, em nível mundial, foi suprido pelo aumento de produtividade.

Vocês têm compromissos assumidos em não contribuir mais para o desmatamento?

Sim. Nosso compromisso com investidores é não fazer a expansão das nossas operações em áreas desmatadas depois de agosto de 2021. Além disso, temos o objetivo de sermos carbono neutro em 2030 nos escopos 1 e 2. Para isso, implementamos projetos de preservação de reservas legais, intensificação do plantio direto e aumento das atividades que contribuem para as remoções de carbono.

Aurélio Pavinato, diretor-presidente da SLC Agrícola Foto: SLC Agrícola/Divulgação

Mas a imagem do Brasil no exterior, em relação ao meio ambiente, ainda tem problemas?

A principal questão é a percepção internacional sobre as queimadas e o desmatamento. A maioria das queimadas no Brasil são criminosas, e isso precisa ser combatido com fiscalização rigorosa. Se reduzirmos esses índices, poderemos melhorar nossa imagem global rapidamente. Mas há 20 anos não tínhamos o reconhecimento que temos hoje como potência agrícola. No entanto, ainda precisamos aprimorar a imagem do país no que se refere à preservação ambiental. Se resolvermos essa questão, consolidaremos ainda mais nossa posição como líder global no agronegócio sustentável.

Essas metas para 2030, que envolvem principalmente as atividades da porteira para dentro, serão atingidas?

A meta foi estabelecida há dois anos e estamos implantando diversos projetos para alcançá-la. Nosso sistema de produção é sustentável agronomicamente, e estamos alinhados à estratégia global de net zero para 2050. Cada setor precisa fazer sua parte para que essa meta se torne realidade.

Olhando também para as outras áreas do ESG, além do ambiental, como a questão social é tratada por vocês na SLC Agrícola?

A educação é um dos pilares fundamentais das nossas ações no social. Desde 2017, desenvolvemos um projeto vinculado à Educação de Jovens e Adultos (EJA), oferecendo ensino fundamental e médio dentro das fazendas. Até 2024, formamos 421 colaboradores, e alguns já ingressaram no ensino superior. Nossa meta até 2029 é garantir que todos os funcionários concluam ao menos o ensino fundamental. É uma iniciativa que tem um impacto muito positivo. O colaborador cresce profissionalmente, a empresa se fortalece e suas famílias também são beneficiadas. Quando um pai estuda, ele incentiva seus filhos a seguirem o mesmo caminho. Temos também a implementação do projeto “Educando para a Vida”, desenvolvido em escolas locais no ensino fundamental, e outro programa voltado para alunos entre 8 e 14 anos que aborda a sustentabilidade. Além disso, o projeto “Agroeduca” leva agrônomos e coordenadores de lavouras para palestras em escolas, disseminando conhecimento sobre o setor agropecuário.

Temos uma guerra comercial em curso entre Estados Unidos e China, como isso afeta o negócio de vocês?

No curto prazo, a disputa vai reduzir os preços nas bolsas de Chicago e Nova York, mas, no sentido oposto, vai gerar um aumento nos prêmios dos portos brasileiros. No médio e longo prazo, isso fortalece o Brasil como fornecedor confiável de alimentos, atraindo mais compradores e garantindo maior liquidez à produção nacional. Mas essas restrições comerciais podem reduzir o crescimento econômico global e o bem-estar social. A globalização trouxe prosperidade e reduziu a pobreza. O fechamento dos mercados pode ter efeitos negativos a longo prazo. É um processo que pode ser bom para o Brasil mas ruim para o mundo.

E o Brasil no meio de tudo isso?

O Brasil pode se beneficiar dessa nova dinâmica, especialmente no que tange à sustentabilidade. A Europa, por exemplo, que costuma impor restrições ao Brasil, pode rever sua posição, pois precisa de fornecedores confiáveis. Além disso, o Brasil demonstrou um avanço tecnológico expressivo na agricultura sustentável, aumentando a produtividade sem comprometer os recursos naturais. A produtividade brasileira é significativamente maior na comparação internacional. Produzimos cerca de 6 toneladas por hectare, enquanto a média mundial é de 3,5 toneladas. Temos a garantia de um sistema produtivo eficiente e perene.

Para toda essa transformação ocorrer investiu-se muito em tecnologia. No caso da SLC Agrícola, como as tecnologias de ponta são aprimoradas? Vocês optam mais pelo desenvolvimento interno ou pela compra?

nternamente, adaptamos a tecnologia às nossas condições ambientais. Por isso, das nossas 23 fazendas, 14 possuem centros de pesquisa, onde testamos novas variedades, variedades de plantas, épocas de plantio e doses de fertilizantes. Esse trabalho de adaptação é essencial. Além disso, estamos sempre conectados às inovações do mercado e buscamos ser pioneiros na adoção de novas tecnologias. Recentemente, testamos um avião autônomo e elétrico, que permite aplicação noturna de produtos biológicos, maximizando a eficiência e reduzindo o uso de químicos.

Esse é outro tema relevante quando se fala em sustentabilidade. O uso de produtos biológicos nas lavouras já é uma realidade significativa?

Estamos investindo fortemente em biológicos, tanto produzidos em biofábricas on-farm quanto adquiridos no mercado. Na última safra, substituímos 14% dos químicos por biológicos, e a tendência é que esse número aumente para cerca de 30% a 50% nos próximos anos. Além disso, estamos aumentando o uso da técnica das aplicações localizadas, o que reduz o uso de defensivos químicos. No último ano, conseguimos economizar 64% de inseticidas e 72% de herbicidas, o que contribui significativamente para uma produção mais sustentável.

Quais são os grandes gargalos que o agronegócio enfrenta hoje?

Se você olhar os últimos 25 anos, de 2000 para cá, quando a demanda mundial cresceu fortemente, puxada pela China, o Brasil expandiu fortemente a sua produção, gerou gargalos logísticos, mas os gargalos logísticos foram sendo superados no Brasil. Primeiro aumenta a produção e depois se resolve a logística, e é assim que tem acontecido ao longo da história. Então, resumindo, para o Brasil aumentar muito a sua produção nos próximos anos, o que precisa ter? Demanda. O Brasil tem tecnologia, pessoas capacitadas e infraestrutura logística em melhoria contínua. Quando a demanda mundial aumenta, o Brasil expande sua produção. Nos últimos 20 anos, crescemos cerca de um milhão e meio de hectares por ano. Nossa logística se adapta conforme a demanda. Além disso, temos um marco regulatório sólido e condições para continuar crescendo de forma sustentável.

Com as demandas, então, as soluções aparecem?

Quando o preço sobe, porque a demanda existe, e aí o Brasil, o produtor brasileiro expande fortemente. Sempre que os ciclos de preços foram altos, o Brasil expandiu fortemente. Nesse momento agora é um ciclo de preços baixos. Qual a mensagem que vem para o produtor brasileiro? Vai com calma, não expande muito. E é assim que funciona o ciclo. O Brasil hoje é um país que tem tecnologia, apesar de todas as dificuldades que a gente enfrenta, tem um marco legal, tem uma regulamentação tecnológica, o uso das biotecnologias, o uso de variedades, de defensivos químicos, registro de produtos. Quer dizer, no geral, e tem ainda as questões tributárias, o Brasil está rodando, eu diria, bem, nessa parte do marco legal, na questão do agro.

Como a COP-30 pode ser relacionada com o agronegócio?

A COP-30 é uma grande oportunidade para o Brasil demonstrar seu potencial de produção sustentável. Precisamos apresentar nossas soluções modernas e eficientes, destacando a conservação ambiental aliada à produtividade. O Brasil tem uma matriz energética renovável exemplar e um setor agroindustrial inovador. A COP30 será um momento crucial para fortalecer nossa imagem global e consolidar o País como referência em produção sustentável e conservação ambiental.

E o que cidadão Pavinato, aquele que saiu do interior do Rio Grande do Sul, da pequena Barreiro, formou-se agrônomo e virou diretor-presidente da SLC Agrícola espera da COP em Belém?

Sempre que trazemos clientes para nos visitar aqui no Brasil, eles saem daqui com uma outra percepção do Brasil. Só o fato de trazermos os estrangeiros para vir aqui nos visitar, obviamente, talvez, eles não terão a oportunidade de visitar aquilo que deveriam visitar, mas vão estar aqui, vão passar por São Paulo, vão passar por Brasília, vão ter mais oportunidade de falar com brasileiros. Isso já é positivo. Eles vão sair do Brasil provavelmente com uma imagem diferente. Quem nunca visitou o Brasil tem uma imagem, lá fora, do Brasil selvagem. Isso é o que a gente ouve. Quem conhece o Brasil já vê que o País tem toda uma estrutura e um potencial de desenvolvimento. Espero que a gente consiga se organizar e mostrar o Brasil verdadeiro, o Brasil que produz, o Brasil que conserva.

Fonte: Estadão Conteúdo

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ℹ️ Conteúdo publicado por Myllena Seifarth sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira

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