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O cenário favorece produtores e exportadores, mas espreme as margens dos frigoríficos de aves e suínos, que estão com dificuldades para repassar o aumento de custos.
Ainda que as cotações do milho tenham recuado quase 20% no mercado internacional neste ano, pressionadas principalmente pelo tombo do petróleo, os preços permanecem em elevado patamar mercado doméstico, sustentados pelo câmbio, pelas incertezas em relação ao volume a ser colhido na safrinha e à demanda até agora aquecida pelo grão, principalmente para a produção de ração. O cenário favorece produtores e exportadores, mas espreme as margens dos frigoríficos de aves e suínos, que estão com dificuldades para repassar o aumento de custos em tempos de atividade econômica retraída por causa da pandemia.
Pressionados pelo petróleo e pelo encolhimento da produção americana de etanol, na bolsa de Chicago os contratos futuros de primeira posição chegaram a registrar o menor valor em 13 anos. Na sexta-feira, os contratos de segunda posição encerraram o pregão a US$ 3,23 por bushel, e passaram a acumular quedas de 6,7% neste mês e 18,2% em 2020. Já o indicador Esalq/BM&FBovespa para a saca de 60 quilos negociada no Brasil fechou a R$ 47,60 na sexta, com baixa de 20,9% em abril mas praticamente o mesmo nível do início de janeiro. No fim de março, a barreira de R$ 60 foi superada.
Embora a deterioração dos preços domésticos tenha se acelerado, analistas apontam que a tendência de queda também vai se aprofundar em Chicago. “Enquanto o petróleo estiver pressionado, há espaço para a cotação cair abaixo de US$ 3 por bushel”, afirmou o analista Carlos Cogo, da Cogo Consultoria.
Victor Ikeda, analista de grãos do Rabobank, avalia que, nesse cenário, o produto brasileiro segue competitivo. “Mesmo com Chicago caindo a US$ 3,20 ou US$ 3,15 por bushel, o grão brasileiro tem prêmio nos portos de US$ 0,38 ou US$ 0,40 por bushel. Nas entregas para setembro, esse prêmio chega a US$ 0,41 bushel. A paridade de exportação limita as quedas no mercado brasileiro”.
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Mas, embora “descolados” de Chicago, os preços internos também deverão acusar os reflexos da entrada da colheita da safra de verão no mercado. “A pressão poderá aumentar, mas o valor praticado ainda é bastante elevado e os negócios acelerados foram expressivos”, diz Cogo. Ele calcula que de 40% a 50% da produção total do grão (verão e inverno) nesta temporada, estimada em 101,8 milhões de toneladas, foi vendida.
André Guillaumon, CEO da BrasilAgro, concorda que o milho no Brasil continua fortalecido, em boa medida porque, até agora, a demanda dos frigoríficos de aves e suínos está elevada. Ocorre que a avicultura, por exemplo já está revisando seu ritmo, porque o consumo doméstico dá sinais de enfraquecimento, e casos de covid-19 entre funcionários já começaram a levar à suspensão temporária das atividades em algumas plantas.
O Rabobank até o momento estima que a demanda do mercado interno deverá somar 68 milhões de toneladas, 4 milhões a mais que em 2019 – 2,5 milhões a mais para etanol e 1,5 milhão a mais para frigoríficos. Mas Ikeda ressalva que as incertezas são crescentes. “Havia uma perspectiva de demanda robusta, tanto para produção de ração quanto para o etanol. Mas o cenário pós-pandemia ainda gera dúvidas”.
Apesar de todas as turbulências, Cogo ainda estima um aumento de 8% na demanda pelo cereal neste ano. “Mas é importante que o país consiga exportar entre 30 milhões e 40 milhões de toneladas para não sobrar muito milho no estoque para a safra seguinte”.
Para que isso aconteça, ele avalia que os preços domésticos no mercado físico terão que se alinhar aos internacionais. Segundo Cogo, enquanto a saca do grão brasileiro custa US$ 12,10, o cereal americano sai por US$ 12,50 a saca.
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Ikeda pondera que, se no mercado spot brasileiro o grão está mais caro, até pela oferta reduzida, contratos com entrega em julho e setembro seguem competitivos e aliados aos prêmios, podem dar suporte para o escoamento da produção em uma eventual queda da demanda do mercado interno.
Para Guillaumon, porém, há outra frente de preocupação, que é a perspectiva de maior oferta e menor demanda nos EUA, por causa da crise do etanol. “Se a situação do petróleo não se reverter, vai ter muito milho americano no mercado externo, o que é preocupante para produtores e regiões muito ligadas ao milho exportação”.
Fonte: Valor Econômico.