Com tecnologia, são desenvolvidos cafés mais produtivos e de melhor qualidade sensorial, veja na matéria abaixo como estão as pesquisas.
Acauã é o nome de um pássaro robusto, com garras pretas, semelhante aos gaviões e comum no sertão nordestino. Foi sua resistência à seca que inspirou o batismo de uma nova variedade de café cujos testes começaram no sul de Minas Gerais em 1982 e que só chega ao mercado nesta terça (19), em edição limitada empacotada como Matiello, pela Orfeu.
São grãos que homenageiam um dos maiores especialistas em genética do café do Brasil, José Braz Matiello, 75, e resultam em uma bebida encorpada, com presença de acidez, doçura e notas de baunilha, caramelo e cacau.
As pesquisas que esse agrônomo desenvolve há mais de 50 anos no setor cafeeiro precedem o trabalho do produtor no campo e têm a capacidade de influenciar o perfil da bebida que chega à nossa xícara.
Esses novos cruzamentos, feitos naturalmente, nada têm a ver com a transgenia hoje difundida na cultura da soja e do milho, por exemplo. Para Matiello, com mais de 3.000 artigos publicados, o melhoramento genético do café, do qual sucedem árvores mais robustas, vigorosas e resistentes a pragas, é o que permite a perenidade dessa cultura.
Segundo ele, variedades mais antigas tendem a ser substituídas, sobretudo em decorrência de novas doenças.
“A gente desenvolve cafés mais produtivos, resistentes e de melhor qualidade sensorial”, diz o especialista, integrante da Procafé, fundação que cria e difunde tecnologia cafeeira por meio de testes em fazendas experimentais mantidos por décadas.
“É preciso fazer várias gerações de uma nova variedade para saber se ela é produtiva e estável. E testamos cada uma delas por quatro safras seguidas para saber se têm permanência em qualidade e produtividade”.
Para o engenheiro agrônomo José Renato Dias, 47, “melhoramento genético e novas tecnologias são muito importantes para a sobrevivência da própria cafeicultura”.
Dias está há 22 anos no comando das fazendas do empresário Roberto Irineu Marinho e da marca Orfeu, uma das mais premiadas no Brasil, com 26 selos do Cup of Excellence, espécie de Oscar dos cafés.
Cultivado a 1.100 metros de altitude no sul de Minas Gerais, o acauã tem grãos vermelhos de maturação uniforme e nasce em árvores vigorosas, de porte baixo. Sua altura facilita a colheita manual e a pulverização, e possibilita maior contato dos frutos com a luz, condição que interfere na qualidade do café —quanto mais luminosidade, maior a concentração de açúcar.
A doçura é ainda reforçada por uma colheita tardia, à semelhança dos vinhos doces. Os frutos amadurecem na árvore mais lentamente num processo em que a polpa perde umidade e o açúcar se concentra e migra para a semente, que, diferentemente das uvas, não perde volume.
Se voltássemos 20 anos no tempo, provavelmente iríamos obedecer à lógica do mercado brasileiro, que historicamente exportou a nata da produção, a maior do mundo, e reteve no país apenas grãos de pior qualidade.
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Hoje, o ainda incipiente movimento dos cafés especiais, que pressupõe complexidade sensorial, rastreabilidade e uma produção sustentável, permite que o Brasil mantenha lotes nobres em seu território.
Esse incremento de qualidade e o aumento de torrefações nacionais, que agregam valor ao grão, são alavancas para o consumo interno, que atravessa um crescimento contínuo há anos. O brasileiro, em média, passou a beber mais doses de café por dia.
“Para mantermos o crescimento do consumo, precisamos acompanhar a tendência da qualidade”, diz Matiello, que acredita que o Brasil irá desbancar os Estados Unidos no posto de maior consumidor de café do mundo.
A jornalista viajou a convite da Orfeu Cafés Especiais
Fonte: Folha de S. Paulo