Justiça impõe segredo em ação contra Syngenta por adulteração de agrotóxicos

Segredo foi pedido tanto pela AGU quanto pela Syngenta. Com a decisão, cidadãos e a imprensa ficam impedidos de acompanhar no sistema eletrônico decisões e sentenças tomadas em ação movida pelo Ibama contra a multinacional por adulteração de agrotóxicos

A Justiça Federal de São Paulo determinou o sigilo do processo movido pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), representado pela Advocacia-Geral da União (AGU), contra a empresa multinacional Syngenta. A companhia é acusada de comercializar agrotóxicos adulterados em sua fábrica de Paulínia (SP).

Em junho, a AGU entrou com a ação pedindo o bloqueio de R$ 90,2 milhões da Syngenta para reparar danos ambientais causados pela venda de 4,5 milhões de litros de agrotóxicos alterados. Segundo o Ibama, a empresa adicionou bronopol, um conservante antibacteriano, em níveis três vezes acima do permitido nos produtos Engeo Pleno, Karate Zeon 250 CS e Karate Zeon 50 CS. A Agência Europeia dos Produtos Químicos classifica o bronopol como muito tóxico para a vida aquática, além de causar sérios danos oculares e irritação de pele e respiratória.

A decisão, diz a empresa, aconteceu após a AGU também se manifestar de forma favorável.

Sigilo processual

O sigilo foi solicitado tanto pela AGU quanto pela Syngenta e foi concedido pela 1ª Vara Federal Cível de São Paulo em audiência realizada na última quarta-feira (17). Com isso, o público e a imprensa ficam impedidos de acompanhar o andamento do processo.

A AGU justificou o pedido de sigilo como medida padrão para evitar a ocultação de patrimônio antes de um eventual bloqueio de bens. Já a Syngenta alegou que a decisão é pertinente para evitar danos irreparáveis à imagem da empresa por divulgação irresponsável de informações descontextualizadas.

“Entendemos relevante a medida considerando a inexistência de qualquer fundamento para a vã alegação de existência de dano ambiental, e considerando ainda o efetivo e irreparável dano à imagem da companhia pela irresponsável divulgação de informações descontextualizadas e sem embasamento técnico ou jurídico, o que certamente restará comprovado quando de seu julgamento”, afirmou a multinacional.

Tentativa de burlar fiscalização

A adulteração dos agrotóxicos foi descoberta em uma fiscalização do Ibama na fábrica da Syngenta em 2021. Durante a inspeção, foram encontrados registros de ordens para retirar insumos da linha de produção durante visitas dos agentes. A ação destaca que a empresa criou um esquema para dificultar a fiscalização, visando manter a produção e comercialização dos produtos adulterados.

Como aconteceu a adulteração?

A adulteração, diz a ação na qual o g1 teve acesso, aconteceu com a adição do bronopol, um conservante antibacteriano, nos produtos Engeo Pleno, Karate Zeon 250 CS, Karate Zeon 50 CS em níveis até três vezes acima do permitido.

No processo, o Ibama aponta que a Syngenta vendeu 4,5 milhões de litros dos três produtos adulterados, gerando mais de R$ 400 milhões de receita. “A adulteração e a comercialização dos agrotóxicos ilegais, em seus milhões de litros, estão suficientemente provadas e assumidas pela empresa ré ao longo dos processos administrativos”, diz.

Segundo a ação, a Agência Europeia dos Produtos Químicos classifica o bronopol como muito tóxico para a vida aquática e alerta que o produto pode causar sérios danos oculares, irritação de pele e irritação respiratória.

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Foto: Divulgação

Posicionamento da Syngenta

A Syngenta refutou as alegações do Ibama, afirmando ter comprovado à Justiça que não há riscos ambientais decorrentes da adição do bronopol aos agrotóxicos. A empresa destacou que a nova formulação dos produtos foi aprovada pelos órgãos competentes, incluindo o próprio Ibama. A Syngenta também mencionou que tomou todas as medidas cabíveis após a fiscalização de 2021, realizando auditorias e implementando melhorias processuais.

“Os próprios órgãos responsáveis pela avaliação e registro de defensivos agrícolas – MAPA, ANVISA e o próprio Ibama – recentemente aprovaram a nova formulação do produto ENGEO PLENO, considerando os níveis de BRONOPOL encontrados nas formulações citadas na ação da AGU”, diz a empresa.

Pedidos da AGU e Ibama

O valor das indenizações deverá ser apurado no curso do processo, mas em caráter de urgência (liminar), os órgãos pedem à Justiça:

  1. Que a empresa seja obrigada a dar destinação aos agrotóxicos adulterados já recolhidos, e que continue identificando e recolhendo do mercado os produtos adulterados.
  2. Que a empresa seja obrigada divulgar em seus sites e redes sociais, tanto em português quanto em inglês, a existência da ação assim como das decisões judiciais nela proferidas, e também expor em seus relatórios e programas de sustentabilidade a ocorrência de adulteração de agrotóxico cometida pela empresa, evitando o greenwashing (maquiagem verde).
  3. Que a empresa seja obrigada, no prazo de 90 (noventa) dias, a incorporar medidas de governança, compliance e controle para evitar quaisquer atos futuros que contribuam para a produção e/ou comercialização de agrotóxicos adulterados ou ilegais, e também evitar práticas orientadas a dificultar ou obstaculizar o exercício das atividades de fiscalização ambientais.
  4. Que a empresa seja intimada a apresentar, em 7 dias, a garantia de reparação dos danos. E, na ausência disso, o bloqueio de R$ 90.295.767,07 para garantir a satisfação da reparação dos danos já levantados na ação.
  5. Que a empresa seja impedida de obter benefícios fiscais e linhas de crédito do governo até que se comprometa com a reparação do dano causado.

A AGU acusou a Syngenta de produzir, comercializar e propiciar o uso de agrotóxicos de forma ilegal, além de práticas de greenwashing (maquiagem verde).

“A parte ré produziu, comercializou e propiciou o uso de agrotóxico de forma ilegal por todo o país, sem lastro de controle e contenção de previsibilidade de efeitos. Além disso, produziu esquema de ocultação de dados e de elementos químicos, somados a práticas de greenwashing”, diz a AGU na ação.

Em nota, a Syngenta reiterou a aprovação da nova formulação pelos órgãos reguladores e criticou a ação da AGU, questionando a falta de fundamentação para as alegações de dano ambiental.

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Ação contra Syngenta. Foto: Divulgação

Nota da Syngenta

A Syngenta Proteção de Cultivos, diante da ação movida pela AGU, apresentou ao juiz seus argumentos, bem como a comprovação da inexistência de qualquer tipo de risco ou dano ambiental decorrente da situação descrita. Demonstrando, ainda, que os próprios órgãos responsáveis pela avaliação e registro de defensivos agrícolas – MAPA, ANVISA e o próprio Ibama – recentemente aprovaram a nova formulação do produto ENGEO PLENO, considerando os níveis de BRONOPOL encontrados nas formulações citadas na ação da AGU.

É importante reforçar que o BRONOPOL é um bactericida largamente utilizado em indústrias como a de cosméticos, de produtos de higiene e limpeza, tintas, entre outras, e que os percentuais utilizados nos defensivos agrícolas mencionados na ação do Ibama são inferiores aos que encontramos, por exemplo, em detergentes, sabão destinado à lavagem de roupas e até mesmo limpadores de mãos

Tais fatos nos fazem questionar o movimento destoante da AGU, considerando todo o diálogo já ocorrido anteriormente com o Ibama, que se materializou em uma conciliação formal endossada pelo órgão.

A Syngenta afirma, ainda, que todas as medidas cabíveis foram tomadas pela empresa diante do ocorrido, incluindo a realização de auditorias externas e internas, implementação de diversas melhorias processuais e de sistema, eliminando qualquer possibilidade de falha da natureza que havia sido apontada na fiscalização do Ibama, ocorrida em 2021.

Por fim, cumpre ressaltar que as partes da ação (Syngenta e AGU) se manifestaram favoráveis, e a Justiça Federal entendeu pertinente, que o processo seguisse em Segredo de Justiça até seu julgamento final. Entendemos relevante a medida considerando a inexistência de qualquer fundamento para a vã alegação de existência de dano ambiental, e considerando ainda o efetivo e irreparável dano à imagem da companhia pela irresponsável divulgação de informações descontextualizadas e sem embasamento técnico ou jurídico, o que certamente restará comprovado quando de seu julgamento.

Compre Rural com algumas informações do G1

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