Justiça de MT determina perícia e cobra nova rodada de documentos do Grupo Safras

O valor da causa foi corrigido para R$ 1,78 bilhão, após a exclusão de R$ 420,6 milhões em dívidas extraconcursais.

São Paulo, 23 – A Justiça de Mato Grosso ainda não aceitou o pedido de recuperação judicial do Grupo Safras. A juíza Giovana Pasqual de Mello, da 4ª Vara Cível de Sinop, determinou uma nova rodada de esclarecimentos e a realização de uma constatação prévia para avaliar a viabilidade do processo. A decisão foi publicada na noite da segunda-feira, 21, no processo aberto no início do mês pelo grupo para reestruturar dívidas estimadas inicialmente em R$ 2,2 bilhões.

O valor da causa foi corrigido para R$ 1,78 bilhão, após a exclusão de R$ 420,6 milhões em dívidas extraconcursais.

O grupo é formado por 40 empresas e produtores rurais dos chamados Núcleo Safras e Núcleo Rossato, liderados por Pedro de Moraes Filho e Dilceu Rossato, ex-prefeito de Sorriso (MT).

A lista inclui Safras Armazéns Gerais, Safras Agroindústria (antiga Copagri), D&P Participações, Rossato Participações e pessoas físicas ligadas às duas famílias empresariais.

A decisão judicial cobra 12 pontos que ainda precisam ser corrigidos ou explicados pelos requerentes. Entre eles, estão balanços sem assinatura de contador, ausência de demonstrações de resultados completas e projeções de fluxo de caixa que não indicam despesas. Em dois casos, as planilhas entregues têm valores zerados, sem detalhamento. A magistrada também apontou inconsistências nos documentos societários, falta de extratos bancários e passivos fiscais sem comprovação.

Segundo a juíza, os documentos apresentados até agora não permitem a análise completa da situação financeira. “Os demonstrativos apresentados apenas indicam a geração de caixa futuro das empresas, sem indicação de despesas”, afirmou. A decisão cita ainda que os dados entregues para Pedro de Moraes Filho e Dilceu Rossato estão zerados e sem justificativas.

Diante disso, a Justiça determinou a realização de constatação prévia, prevista na Lei de Recuperação Judicial (11.101/2005), para aferir se as informações entregues são consistentes e correspondem à realidade. A perícia será feita pela empresa AJ1 Administração Judicial, sob responsabilidade do administrador Ricardo Ferreira de Andrade. O laudo deverá ser entregue em cinco dias e abranger a verificação de livros contábeis, funcionamento operacional e titularidade dos ativos essenciais. A remuneração provisória da perícia foi fixada em R$ 45 mil, a ser paga pelos requerentes.

A planta industrial de esmagamento de soja em Cuiabá e 14 armazéns com capacidade total superior a 700 mil toneladas foram indicados como essenciais. A unidade industrial tem capacidade de esmagamento de 1.700 toneladas por dia, recebe até 50 caminhões e emprega mais de 180 pessoas. A juíza determinou que o perito avalie a finalidade operacional de cada ativo, a atual posse e a situação de registro para decidir se podem ser classificados como bens de capital essenciais.

O grupo alega que a crise começou em 2023, com a queda de até 62% nos preços da soja entre janeiro e julho. Segundo a petição inicial, apenas 40% da produção daquele ano foi comercializada. A compra da Copagri, a retomada da planta industrial e os investimentos em uma usina de etanol de milho foram feitos sem estrutura de project finance, o que comprometeu o caixa. O grupo também cita a falência da consultoria responsável pela implantação do sistema SAP como um dos fatores que causram impacto na operação.

Entre os credores listados, o Bravano Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC), gerido pela Flowinvest, aparece com R$ 284,1 milhões em créditos extraconcursais. A própria Flowinvest também consta como credora direta com R$ 98,8 milhões em créditos sujeitos à recuperação judicial. Entre os bancos, o principal credor é o Banco do Brasil, com R$ 303,6 milhões, seguido por Sicoob Credisul (R$ 92,7 milhões), Caixa Econômica Federal (R$ 69,6 milhões), Bradesco (R$ 43,3 milhões) e Oliveira Trust (R$ 92,4 milhões). A lista inclui também dezenas de produtores rurais, fornecedores, cooperativas e empresas de insumos.

A solicitação de recuperação provocou o vencimento antecipado de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) lastreados em dívidas da antiga Copagri. Os papéis estão presentes em dois Fiagros listados na B3: o Vectis Datagro (VCRA11), com exposição de 3,5% do patrimônio, e o Itaú Asset Rural Fiagro (RURA11), com 0,7%.

Na manifestação protocolada no dia 17, o grupo entregou uma nova lista de credores, com versões pública e sigilosa, além de demonstrativos financeiros e projeções de fluxo de caixa. A petição também informa que algumas das empresas requerentes foram constituídas há menos de dois anos, mas pede que sejam incluídas no processo com base em jurisprudência que permite essa flexibilização em grupos familiares.

A decisão judicial adiou a análise dos pedidos de tutela de urgência, como a suspensão de execuções e reintegrações de posse, até que todos os documentos estejam regularizados. “A apreciação será oportunamente realizada”, escreveu a magistrada. Também foram suspensas, por ora, as manifestações de credores ou terceiros interessados. “Não há espaço para apreciação de manifestações relacionadas a interesses de credores”, afirmou, destacando que o processo ainda está em fase preparatória.

Segundo reportagem publicada pela Agfeed e confirmada pelo Broadcast Agro (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado), o Grupo Safras estuda um plano de recuperação que pode incluir a venda da usina de etanol em Sorriso, a retomada parcial da operação de armazenagem na safrinha de milho e mudanças no modelo de negócios da agroindústria em Cuiabá. A planta industrial, atualmente parada, opera sob contrato com a Engelhart, trading ligada ao BTG Pactual.

A juíza também determinou o envio de ofícios às prefeituras de Nova Mutum e Campo Novo do Parecis, solicitando os relatórios atualizados de débitos fiscais das filiais da Safras Armazéns Gerais. Em outros municípios, o grupo relatou dificuldades para obter as certidões, uma vez que algumas prefeituras condicionam a emissão à quitação de débitos.

Se a perícia confirmar que o grupo atende aos requisitos legais, o juízo poderá aceitar o pedido e autorizar a tramitação do processo de recuperação. Nesse caso, o grupo terá prazo para apresentar um plano de reestruturação, que será submetido à votação dos credores em assembleia.

Siga o Compre Rural no Google News e acompanhe nossos destaques.
LEIA TAMBÉM