Insumo inédito faz milho produzir três vezes mais

A falta de chuvas nas lavouras reduziram em 15% a produção de milho; Agora com o insumo inédito, mesmo com a seca, ele faz milho produzir três vezes mais!

Cientistas do Centro de Pesquisa em Genômica Aplicada às Mudanças Climáticas (GCCRC), ligado à Universidade de Campinas (Unicamp), e da Embrapa desvendaram como agem os micro-organismos que ajudam o milho a enfrentar a escassez de água. Os pesquisadores brasileiros relatam a descoberta em um artigo que a revista científica “Frontiers in Microbiology” publicará hoje.

Na pesquisa, os cientistas primeiro identificaram e catalogaram os milhares de micro-organismos que vivem nas plantas de milho. Depois, eles registraram os efeitos da interação entre essas estruturas microscópicas e as plantas. Nessa análise, os pesquisadores detectaram quais dos diferentes fungos e bactérias melhoram a resistência do milho a episódios de estresse hídrico e descobriram como é, na prática, a ação dos micro-organismos “antisseca”.

A nova proteína foi nomeada DRIK1 (quinase inativa responsiva à seca 1, na sigla em inglês). Os pesquisadores encontraram ainda uma molécula sintética que se liga a ela, possibilitando que, futuramente, possam ser produzidas plantas que tenham a atividade da proteína naturalmente reduzida ou mesmo desenvolvidos produtos capazes de inibir a sua ação.

“É uma proteína que, em condições normais, controla mecanismos de desenvolvimento da planta e inibe os genes de resposta ao estresse. Quando ocorre uma seca ou um ataque por patógenos, os níveis da proteína são diminuídos e o milho desencadeia a resposta necessária para controlar os efeitos da seca, do calor ou do ataque de patógenos”, explica Paulo Arruda, professor do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp e coordenador do GCCRC.

Os cientistas produziram um insumo biológico com uma seleção dos micro-organismos que estavam mais presentes nas plantas mais resistentes à falta de água. Para avaliar o efeito desse composto, os pesquisadores o aplicaram em sementes de milho e compararam as plantas nascidas dessas sementes às que não receberam a solução.

No milho que recebeu o composto, a temperatura das folhas chegou a cair 4°C quando as plantas foram submetidas a um calor intenso. Foi graças à ação dessa “comunidade sintética” de micro-organismos que as temperaturas caíram: eles melhoraram o fluxo de água nas plantas.

A descoberta sobre a dinâmica de funcionamento dos fungos e bactérias do milho é inédita na literatura científica, segundo Paulo Arruda, professor da Unicamp e coordenador do GCCRC. Esses micro-organismos “comunicam” à planta quando há escassez de água, diz. A sinalização dada pelas bactérias ativa os genes da própria planta para que ela reaja aos diferentes níveis de umidade. “A comunidade de micro-organismos sintéticos funciona como um ‘antitérmico’ da planta”, explica o professor.

O experimento com a aplicação do insumo biológico foi feito em 2019. Ao longo de quatro meses, os pesquisadores acompanharam o desenvolvimento de um total de 500 plantas, geradas a partir de três diferentes tecnologias de sementes. Em condições normais de acesso à água, não houve diferença de desempenho entre as que receberam o composto e as que não receberam, mas o contraste ficou evidente nos episódios de estresse hídrico.

Em condições de estiagem severa, com acesso a apenas 25% da água que normalmente receberiam, as plantas nascidas das sementes que receberam o insumo biológico chegaram a ter produtividade três vezes maior do que as que não receberam, conta Jaderson Armanhi, pesquisador do GCCRC e autor do estudo. “O produto biológico acaba funcionando como um seguro da planta”, diz.

As plantas nascidas das sementes que receberam o insumo biológico chegaram a ter produtividade três vezes maior do que as que não receberam, conta Jaderson Armanhi, pesquisador do GCCRC e autor do estudo.

Armanhi é biólogo molecular de formação, mas, para o estudo, ele também enveredou por áreas como engenharia eletrônica e programação para desenvolver, ele próprio, os sensores que mediram parâmetros como temperatura, fluxo de água e fotossíntese das plantas. “Os sistemas atuais são muito caros”, diz. Com medição em tempo real – outra característica que diferencia o modelo usado no estudo dos sistemas convencionais -, Armanhi e os pesquisadores Rafael de Souza, Bárbara Biazotti (Unicamp) e Juliana Yassitepe (Embrapa) levantaram mais 5 milhões de dados.

Para que se possa compreender que efeitos práticos pode ter a descoberta do grupo de cientistas, a última safra brasileira de milho é bastante eloquente. Problemas causados principalmente pela falta de chuvas nas lavouras reduziram em 15% a produção de milho no país na temporada passada. A colheita da safrinha, mais diretamente atingida pela estiagem, caiu mais de 20%.

Resposta à seca

Para encontrar a proteína DRIK1, os pesquisadores buscaram, em um banco de dados público, genes relacionados com a resposta à seca em plantas. Um plantio de milho foi realizado em estufa por 15 dias e uma parte das plantas foi regada normalmente durante esse período. A outra parte foi dividida em três grupos, que ficaram 9, 12 ou 14 dias sem irrigação.

Amostras de folhas e raízes tiveram o RNA sequenciado. Os pesquisadores observaram que as plantas submetidas à seca têm uma expressão reduzida da DRIK1, mas os níveis voltam ao normal quando a planta é reidratada.

Informações colhidas no mesmo banco de dados onde foi identificada a família de proteínas à qual a DRIK1 pertence mostraram, ainda, que provavelmente ela tem o mesmo padrão de atividade quando há aumento na temperatura e durante o ataque de pelo menos dois fungos diferentes.

Os pesquisadores analisaram ainda a estrutura tridimensional da proteína e mapearam regiões potencialmente importantes para a função de resposta aos estímulos gerados pelo estresse. Essas regiões, futuramente, podem servir como alvo para compostos que modulem a função da proteína.

O grupo trabalha agora na produção de plantas com o gene que expressa a DRIK1 alterado. A expectativa é obter, futuramente, variedades mais resistentes à seca, como algumas que tenham uma expressão diminuída da proteína e que respondam mais rápido à falta de água, por exemplo.

“Se conseguirmos uma variedade que, durante uma seca, resista um pouco mais do que as outras, será como ter um seguro genético. Perdas sempre haverá, mas, se for possível diminuí-las, isso já significa toneladas de alimentos sendo salvas”, afirma Arruda.

O artigo Crystal structure of DRIK1, a stress-responsive receptor-like pseudokinase, reveals the molecular basis for the absence of ATP binding (doi: 10.1186/s12870-020-2328-3), de Bruno Aquino, Viviane C. H. da Silva, Katlin B. Massirer e Paulo Arruda, pode ser lido em: https://bmcplantbiol.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12870-020-2328-3.

As informações são da Agência FAPESP e Valor Econômico, adaptadas pela equipe Compre Rural

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