Governo prepara aumento de 1,5% nos juros do Plano Safra 2025/26

Alta nas taxas nos juros do Plano Safra 2025/26 pressiona produtores, expõe fragilidades na política agrícola e reacende debate sobre a eficácia do crédito rural no Brasil

O Plano Safra 2025/26 ainda não foi oficialmente lançado, mas já gera apreensão entre produtores, instituições financeiras e parlamentares ligados ao agronegócio. O motivo: o governo estuda aumentar em até 1,5 ponto percentual os juros de todas as linhas de financiamento rural, com exceção dos programas voltados aos pequenos produtores do Pronaf.

A sinalização de alta generalizada nos custos do crédito reacende uma antiga preocupação do setor: como manter a competitividade do agro brasileiro diante de um ambiente financeiro cada vez mais restritivo?

A informação foi antecipada por Carlos Aguiar, diretor de Agronegócios do Santander, que participou das discussões com o governo e outras instituições durante a Agrishow 2025, em Ribeirão Preto (SP). “Diria que, em linhas gerais, que qualquer um pode tomar, deve haver aumento de taxa sim. Um aumento de até 1,5 ponto percentual”, afirmou o executivo.

Fontes próximas ao Palácio do Planalto confirmaram a intenção do governo à imprensa, mas ainda sem detalhar os percentuais ou quais linhas serão afetadas diretamente.

A matemática do crédito rural: juros maiores, riscos maiores

O Plano Safra 2025/26 é o principal instrumento de apoio à produção agropecuária nacional. Ele oferece linhas de crédito para custeio, investimento e comercialização, muitas delas com juros subsidiados. No entanto, mesmo os financiamentos com apoio público não estão imunes aos efeitos da taxa Selic, hoje em 10,75% ao ano.

Quando o governo não amplia os recursos para equalização de juros — ou seja, para cobrir a diferença entre a taxa real de mercado e o que o produtor paga —, os bancos tendem a repassar esse custo aos tomadores finais, elevando as taxas mesmo nas linhas teoricamente mais acessíveis.

A Lei Orçamentária Anual de 2025 manteve em R$ 15,03 bilhões o valor destinado à equalização, o mesmo patamar do ano passado. Para analistas e representantes do setor, esse valor é insuficiente diante do atual cenário de inflação de custos e demanda por crédito. O próprio governo, por meio do secretário de Política Agrícola do Mapa, Guilherme Campos, admitiu que o ideal seria liberar R$ 24 bilhões para equalização.

Setor cobra R$ 599 bilhões e mais previsibilidade

Em resposta à preocupação com os juros e com o possível estrangulamento no crédito, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) propôs um Plano Safra no valor de R$ 599 bilhões, um aumento de 25,7% em relação ao ciclo 2024/25. Deste total, R$ 25 bilhões seriam voltados exclusivamente à equalização de juros, e outros R$ 6 bilhões ao seguro rural.

O deputado Pedro Lupion (PP-PR), presidente da FPA, foi enfático: “Um crédito mais barato, com mais segurança e com o montante disponibilizado com mais facilidade significa maior produção, alimentos mais baratos e diminuição da inflação”. Já Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), vice da bancada, destacou que a proposta vai além do campo: “É uma proposta de país”.

Análise: o Plano Safra 2025/26 pode repetir os mesmos erros

Apesar dos números robustos e da retórica otimista, há um vácuo entre o que se promete e o que se entrega. Historicamente, o Plano Safra sofre com a burocracia, atrasos na liberação de recursos, subfinanciamento do seguro rural e descompasso entre a política pública e a realidade do campo.

Como alerta o analista Miguel Daoud, “o novo Plano Safra corre sério risco de ser apenas mais um show de cifras sem efeito prático”. Pequenos e médios produtores continuam sendo os mais prejudicados, com pouca proteção frente a eventos climáticos extremos e baixa margem de manobra diante da alta de custos.

Para além dos recursos, falta ao governo uma estratégia estruturada que envolva simplificação do acesso, previsibilidade orçamentária e integração entre seguro, crédito e assistência técnica. O modelo atual parece cada vez mais esgotado diante das demandas de um agronegócio moderno, tecnológico e globalizado.

Perspectivas: inovação, mas para poucos

Durante a Agrishow, o presidente em exercício Geraldo Alckmin anunciou uma linha de crédito de R$ 80 bilhões, com juros de 4% ao ano via BNDES, voltada à inovação e modernização do setor agropecuário. A iniciativa foi bem recebida, mas não cobre a demanda de custeio da produção em larga escala, especialmente entre os médios produtores.

A expectativa de uma safra recorde em 2024/25 e a queda do dólar podem ajudar a segurar a inflação de alimentos, mas não resolvem o dilema central: como garantir crédito acessível e sustentável para todos os elos da cadeia produtiva?

Plano Safra 2025/26 será decisivo para a confiança do setor

O Plano Safra 2025/26 representa mais que um pacote financeiro: ele será um termômetro da relação entre governo e agro. Com os juros em alta e sem aumento proporcional na equalização, o risco de retração nos investimentos rurais aumenta, comprometendo produtividade, renda no campo e abastecimento nacional.

Para evitar que o plano se transforme em apenas uma vitrine política, será preciso coragem para rever modelos, ouvir o setor produtivo e colocar o crédito rural como ferramenta estratégica de desenvolvimento — e não de contingência fiscal.

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