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Atordoados por uma das piores secas já registradas, os cafeicultores do Brasil venderam quase todos os seus grãos meses antes da nova safra.
Em um armazém de café brasileiro, normalmente lotado com 250 mil sacas do aromático grão, vozes ecoam no espaço praticamente vazio de uma grande cooperativa de produtores.
Atordoados por uma das piores secas já registradas, os cafeicultores do Brasil venderam quase todos os seus grãos meses antes da nova safra, já que os preços globais quase dobraram para máximas históricas nos últimos 14 meses.
Os consumidores que acordavam para sentir o cheiro do café foram sacudidos no ano passado, quando a Starbucks aumentou o preço de uma xícara grande de café fresco em cerca de 16%, para até US$ 3,85. Os assinantes do pod de café Nespresso em breve pagarão até US$ 1,45 por pod básico, ante US$ 1,30.
Os preços do arábica, o grão mais popular, usado na maioria dos cafés torrados e moídos, subiram 70% em 2024 e quase 20% este ano, atingindo uma alta histórica acima de US$ 4,30 por libra em 11 de fevereiro. O robusta, o segundo grão mais popular, frequentemente usado no café instantâneo, subiu 72% em 2024 e atingiu o pico de US$ 5.847 por tonelada métrica em 12 de fevereiro.
No entanto, os apreciadores de cafeína não conseguem largar o hábito. Eles podem novamente beber mais café do que o produzido globalmente em 2025 — pela quarta vez nos últimos seis anos.
Os produtores do Brasil, o maior produtor de café do mundo, aumentaram seus estoques para lucrar com exportações recordes em 2024. Mas as exportações do Vietnã caíram 17,2% em relação a 2023, já que o principal fornecedor de robusta enfrentou o mau tempo no ano passado.
“Nunca tivemos estoques tão baixos em fevereiro, período ainda distante da nova safra”, disse Willian Cesar Freiria, gerente de vendas da Cocapec, terceira maior cooperativa de café do Brasil, na cidade de Franca, no interior de São Paulo.
A Cocapec recebeu 1,1 milhão de sacas de produtores associados em 2024, abaixo dos 1,5 milhão de sacas em 2023, devido à menor produção na região, após mais um ano de chuvas abaixo da média.
“Até o início da próxima colheita, não teremos muito café para vender”, disse Freiria. “E não somos só nós; é o mesmo em todos os lugares.”
A oferta parece maior apenas na Cooxupé, a maior cooperativa de café do mundo, no estado de Minas Gerais, o maior produtor do Brasil.
“Você vê muito café nos armazéns, mas quase tudo é café já vendido para clientes finais. Eles estão aqui apenas esperando para serem embarcados”, disse Andre Silva Pinto, coordenador de armazenagem da Cooxupe.
Os cafeicultores já venderam 90% da safra de 2024, acrescentou Luiz Fernando dos Reis, superintendente de vendas da Cooxupe. “O que sobrou é a menor quantidade que já vimos em nossos registros.”
Grandes sacos de uma tonelada de arábica estão ocupando cerca de 70% do espaço no complexo de armazenagem Japy da Cooxupe, enquanto metade dos outros 45 silos a granel estão cheios. O complexo pode armazenar 2,6 milhões de sacos de 60 kg, o equivalente ao consumo de um mês nos Estados Unidos, o maior país consumidor de café do mundo.
Vendido
A estimativa da Cooxupe sobre as vendas dos agricultores está em linha com dados recentes que mostram níveis de estoque historicamente baixos. A consultoria Safras & Mercado estimou que os agricultores venderam 88% da safra de 2024. A corretora Pine Agronegocios disse que restaram apenas 8%.
Silva Pinto disse que o complexo Japy estará 80% vazio até maio, já que a maior parte do café já teria sido embarcada e a cooperativa se prepara para receber a nova colheita que começa por volta de maio ou junho. A cooperativa não espera que o café da nova safra esteja pronto para embarque antes de julho.
Osmar Junior, um membro da Cooxupe que cultiva arábica no município de Piumhi, no sul de Minas Gerais, disse que nem ele nem seus vizinhos têm mais café para vender. Ele só começará a colher a nova safra por volta do final de maio.
Paulo Armelin, que cultiva perto de Patrocínio, na região do Cerrado Mineiro, é uma exceção, mantendo 40% de sua safra de 2024 como precaução.
“Terei uma produção menor este ano, então decidi guardar um pouco de café do ano passado como reserva para caso precise”, disse ele.
Armelin, que vende grãos de alta qualidade diretamente para quatro clientes dos EUA, está negociando com uma torrefadora de São Francisco. Ele está esperando uma resposta após pedir US$ 4,50 a libra, acima dos US$ 3,05 do ano passado.
“É um café muito bom e estou realmente cortando o prêmio que eu tinha sobre os futuros”, disse ele, referindo-se aos contratos de venda a um preço pré-determinado em uma data futura.
Luis Norberto Pascoal, proprietário da Daterra Coffees, uma grande produtora de café arábica de alta qualidade, está feliz que os pequenos produtores estejam obtendo mais lucros, mas duvida que os preços atuais possam ser sustentados.
Muitos torrefadores não terão meios para comprar grãos e procurarão maneiras de cortar custos, ele disse. “A qualidade vai cair.”
Reportagem de Roberto Samora em Guaxupé e Marcelo Teixeira em Nova York; Edição de Simon Webb e Richard Chang
Fonte: Reuters
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ℹ️ Conteúdo publicado por Myllena Seifarth sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira
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