As perdas durante a colheita da soja são significativas; “o que mais me assustou é que as perdas não estão só ligadas à máquina que faz a operação, mas um conjunto de vários fatores”
Por Leonardo Henrique Jardim Gomes* – Não é nenhuma novidade que o Brasil se tornou o maior produtor e exportador de soja do mundo. Segundo um levantamento feito pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) em maio de 2022, produzimos cerca de 123.829,5 milhões de toneladas do grão em cerca de 40.921,9 milhões de hectares. Mesmo os números sendo bem expressivos, isso representa apenas 5% da área do solo brasileiro, ou seja, ainda temos uma larga capacidade de expansão. Essa expansão irá acontecer de acordo com os avanços tecnológicos e com a crescente importância desse grão. Dele derivam-se grãos para a alimentação humana, para a nutrição animal, para extração do óleo na produção de bens de consumo para cozinha, medicamentos e biodiesel.
Mesmo o Brasil sendo o maior produtor de soja do mundo, nossa produtividade média fica em 3.362 kg por hectare. Isso representa uma média não tão satisfatória de 56 sacos de soja por hectare. Daí fica o seguinte questionamento “quais são as causas para que essa produtividade não seja ainda maior?” Pensando nisso, procurei entender quais são os principais motivos agronômicos para justificar essa média relativamente baixa. Dentre as diversas justificativas, gostaria de destacar as perdas que acontecem durante a colheita da cultura.
Consultei algumas fontes confiáveis e destaco a recomendação feita pela EMBRAPA que uma perda aceitável ficaria entre 60kg por hectare, ou seja, 1 saco de soja. Conversando com vários produtores rurais, percebi que a minoria deles consegue manter uma média de perda nesse nível ou abaixo disso. Alguns simplesmente não fazem esse acompanhamento, ou por falta de conhecimento de um método prático ou por simplesmente ignorarem essas perdas. Vendo o cenário de que as perdas são ainda maiores que 1 saco por hectare, fui atrás de respostas dos principais motivos das perdas ainda manterem altas.
Dentre todas as pesquisas e estudos que fiz, o que mais me assustou é que as perdas não estão só ligadas à máquina que faz a operação, mas um conjunto de vários fatores. Primeiro, gostaria de destacar que as perdas numa lavoura podem ocorrer antes mesmo de começar a colheita. O principal motivo é a debulha natural (abertura da vagem), que é um processo que acontece posteriormente ao enchimento de grãos e maturação da planta e que está ligado a cultivar, tendo umas que são mais suscetíveis e outras menos. Esse processo pode se intensificar ainda mais quando há atraso na colheita, principalmente em condições de alta umidade e temperatura elevada, o que faz algumas vagens romperem e os grãos caírem no solo.
Outra importante justificativa ainda ligada a cultivar são as características morfológicas da planta: altura de planta, inserção das primeiras vagens, número de ramificações e acamamento. Cada cultivar terá sua característica para cada uma dessas morfologias, por isso é importante que o produtor esteja alinhado com elas para estabelecer um plano estratégico de como evitar as perdas. Destaco que a inserção das primeiras vagens pode ser um problema comum em muitas propriedades. Isso por que esse problema pode ser causado tanto por fatores genéticos quanto pela semeadura da cultura.
Em algumas análises, percebi que os usos das botinhas para adubação durante a semeadura fazem com que o início do caule da planta fique “enterrado” na superfície do solo e causa uma baixa inserção das vagens. Quando a plataforma de corte passa pela cultura, algumas vagens ficam abaixo do nível dela e ficam ligadas a parte remanescente do caule, como pode ser visto na imagem abaixo:
O mesmo pode acontecer para a altura da planta, plantas menores que 50 centímetros vão favorecer perdas expressivas. Outro problema é o acamamento da cultura. Quando acontece isso dentro da lavoura e a plataforma passa para colher a cultura, o molinete de recolhimento “agarra” em algumas plantas e levanta elas, espalhando grãos e justificando parte das perdas. Segundo a EMBRAPA, uma lavoura com 60% de plantas acamadas pode acarretar em 15% de perdas de grãos. As ramificações também justificam parte da perda, isso por que pode acontecer a quebra de ramos e, consequentemente, não serão colhidos pela colhedora.
Três principais motivos das perdas na lavoura de soja
Por fim, na minha opinião, destaco os três principais motivos das perdas: operador, ponto de colheita e regulagem do maquinário. Quem nunca escutou de um produtor rural ou passou pela situação de ter dificuldade de encontrar operadores capacitados para operar as colhedoras?! Apesar de ser uma realidade enfrentada pelos produtores, percebi que boa parte das perdas vem do operacional. Isso por que a velocidade de colheita e manobras influenciam muito durante o processo.
Outro fator é o ponto de colheita. Todo produtor e agrônomo deve ter o conhecimento do momento certo de entrar com a colheita, isso por que vagens/plantas ainda muito úmidas (antes do ponto certo) dificultam o processo e aumentam as perdas e vagens/plantas muito secas (depois do ponto certo), favorecem as perdas. O indicado é identificar o estádio fenológico R8 da cultura (95% das plantas com cor característica para a colheita) e esperar de cinco a dez dias para as vagens perderem umidade e atingirem 13-15% de umidade. Quando a colheita é feita nesse intervalo, os danos mecânicos e as perdas são minimizadas. Muito produtores usam também a técnica da dessecação para antecipar a colheita a fim de encaixar melhor a janela de plantio da segunda safra. Caso seja feito, continue atento ao ponto de colheita.
Por fim, temos as regulagens do maquinário. Não irei me aprofundar nessa parte mecânica da máquina pois exige um conhecimento específico que não posso orientar. Mas, o ideal é que o produtor sempre mantenha seu maquinário com as regulagens e manutenções bem-feitas e em dia e, se possível for, feita por uma equipe especializada.
Tendo consciência de todo esse cenário, decidi fazer uma avaliação das perdas de colheita na safra de soja. A fim de trazer uma variação para esse estudo, busquei avaliar diferentes colhedoras em diferentes pontos para cada uma delas. Sendo assim, avaliei 4 colhedoras: 2 colhedoras Case 7230, uma colhedora Case 6250 e uma John Deere S660. Diante mão, já gostaria de deixar claro que meu intuito não é comparar ou dizer qual colhedora é melhor ou pior, apenas avaliar a fim de dados estatísticos.
Para fazer a coleta dos grãos, escolhi a seguinte metodologia: após a colhedora passar fazendo a colheita da cultura, marquei um retângulo paralelo a plataforma de colheita de 0,2 metros de largura por 10 metros de comprimento (totalizando 2 metros quadrados). O retângulo foi feito com barras de ferro e barbante. Importante dizer que bordaduras e rastro de pulverizador foram desconsiderados. Em seguida, foi feita uma coleta minuciosa dos grãos depositados no chão e armazenados em saco plástico.
Por fim, fiz a limpeza de todos os grãos, depositei e identifiquei eles em um copo plástico e, com a ajuda de uma balança, pesei todas as repetições (desconsiderando o peso do copo). Para as duas Cases 7230 foram feitas 3 coletas em 3 pontos diferentes, para a John Deere S660 e a Case 6150 foram feitas duas coletas para cada uma, totalizando 7 coletas diferentes.
Para os resultados dessa avaliação, nós temos:
Fazendo uma análise mais profunda de todos esses resultados, podemos chegar na óbvia conclusão que todas as perdas estão altas. Por isso, resolvi analisar todos os casos para identificar o motivo de cada situação. No caso das colhedoras case 7250 e da John Deere S660, arrisco dizer que os principais motivos para justificar essas perdas foram o acamamento, a inserção das primeiras vagens e o operador. Isso por que a região desta lavoura teve alguns problemas com ventos fortes que acabaram acamando parte da cultura.
Além disso, verifiquei também que eles utilizam a botinha para adubação de semeadura, sendo um possível causador das inserções de vagens estarem baixas e próximas a superfície do solo. Por fim, o operador que acabou elevando um pouco a velocidade de colheita. Para a colhedora case 6250, a justificativa mais plausível que encontrei foi desníveis de solo que fazem causar algumas perdas.
Fui ainda mais fundo e resolvi fazer um levantamento de quanto esses resultados poderiam significar a nível nacional. Para isso, fiz a média das 4 colhedoras, chegando ao resultado de que em média elas deixaram de colher 3,65 sacos de soja por hectare. Em seguida, considerei que essa perda se manteria para toda a área de soja semeada no Brasil. A título de curiosidade, se perdêssemos todos esses grãos em toda a área, isso representaria cerca de 23,14 bilhões de reais literalmente jogados no chão!
Para finalizar, gostaria de reafirmar que esses resultados não são um padrão, cada propriedade rural terá sua perda. Além disso, todas essas avaliações foram feitas a fim estatísticos e para atentar os produtores rurais da importância de avaliar as áreas e manter uma boa colheita. Afinal, quem sai perdendo é ele. Como possíveis soluções: analise muito bem a cultivar que você irá utilizar, pense sempre no histórico climático da sua região; trabalhe muito bem os operadores que vão efetuar sua colheita, mantenha eles sempre sob supervisão (mesmo que a colheita seja terceirizada) e busque treinamentos de capacitação para sua equipe; estude e sempre tenha a melhor capacidade possível de identificar o ponto de colheita da cultura; e se atente e mantenha sempre em ótima condições de regulagens e manutenção os seus maquinários! Espero ter ajudado!
Leonardo Henrique Jardim Gomes é estudante de Agronomia. Contato pelo Instagram e e-mail.
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