Crédito rural mais difícil e juros nas alturas: o alerta para o produtor rural

“A cada nova decisão em Brasília, vejo se formar uma tempestade que ameaça não só a sustentabilidade do agronegócio”, afirma especialista

Por Leandro Marmo* – Nos últimos meses, tenho acompanhado com crescente inquietação os desdobramentos políticos e econômicos que afetam diretamente o campo. A cada nova decisão em Brasília, vejo se formar uma tempestade que ameaça não só a sustentabilidade do agronegócio, mas a sobrevivência de milhares de produtores rurais. O que temos agora é um cenário de crédito escasso, juros impraticáveis e um setor cada vez mais pressionado por instabilidades econômicas e financeiras

A elevação da taxa Selic para 14,25% ao ano, anunciada em março, não é apenas um número frio. Na prática, significa empréstimos com juros superiores a 20% ao ano nas linhas de recursos livres — que, vale lembrar, representam mais de 70% de todo o financiamento bancário disponível ao produtor rural. Isso, num momento em que o produtor precisa investir para plantar, mas corre o risco de trabalhar a safra inteira para pagar o banco — e ainda terminar no vermelho. É uma equação difícil de fechar.

Enquanto isso, o crédito vai ficando mais seletivo, mais caro e, em alguns casos, simplesmente inacessível. Conversei com colegas e clientes nas últimas semanas que tiveram propostas de financiamento com garantias cada vez mais rígidas e prazos cada vez mais curtos. Isso não é coincidência. O mercado está desconfiado, os bancos estão cautelosos, e os riscos estão aumentando. A inadimplência no agro, segundo o próprio Serasa, já vinha subindo desde o fim de 2024, e a tendência é que isso se agrave. O produtor que já estava endividado empurrou a dívida para 2025. Mas agora, não há mais muito para onde empurrar.

O cenário político também adiciona camadas de complexidade. O país caminha para mais uma eleição presidencial, e todo o setor produtivo — do agronegócio à indústria urbana — parece ter entrado em compasso de espera. A polarização e a incerteza sobre quem estará à frente da economia a partir de 2026 têm paralisado decisões de investimento, represado capital e enfraquecido ainda mais a confiança no ambiente de negócios.

A aprovação do Orçamento Federal de 2025, após mais de três meses de atraso, trouxe algum alívio, mas também escancarou a dificuldade de planejamento que vivemos até aqui. Com os recursos do governo limitados mês a mês, o setor agrícola ficou sem saber com o que poderia contar. Agora, com os números na mesa — R$ 5,8 trilhões de orçamento —, já se projeta o Plano Safra mais caro da história. E não é só por causa dos insumos, que seguem dolarizados. É pelos juros. Pela insegurança econômica. Por um crédito cada vez mais exigente.
Também temos visto um aumento expressivo nos pedidos de recuperação judicial de grandes empresas do setor. A AgroGalaxy já entrou com o seu, com um passivo bilionário. A Portal Agro veio na sequência. E, mais recentemente, a Lavoro Agro contratou a mesma consultoria que assessora a AgroGalaxy, o que chamou atenção do mercado. Ainda que a Lavoro tenha reafirmado sua solvência, esse tipo de movimentação apenas confirma que estamos, sim, atravessando a maior crise financeira da história do agro brasileiro. O volume envolvido nessas reestruturações é gigantesco — e isso gera, naturalmente, instabilidade e receio por parte dos credores e das instituições financeiras.

Vivemos um momento em que o produtor rural está encurralado entre a incerteza política e o estrangulamento financeiro. E não é exagero dizer que parte expressiva do agronegócio está hoje à beira de um colapso silencioso — silencioso porque, no campo, não há tempo para protesto. Há terra para cuidar, contas para pagar e riscos que não esperam.

Minha orientação tem sido a mesma, repetida como um mantra aos meus clientes e parceiros: cautela. Planeje cada investimento como se estivesse num campo minado. Reavalie seu endividamento. Negocie com seus credores. Diversifique, se possível. E, acima de tudo, mantenha-se informado e juridicamente amparado. As próximas safras exigirão mais do que gestão técnica: exigirão inteligência jurídica, firmeza emocional e visão estratégica.

Porque plantar, hoje, é também um ato de resistência.

Leandro Marmo é advogado especialista em direito do agronegócio, CEO da banca João Domingos Advogados

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