Pesquisadores adaptam o sistema para que funcione também em telefones celulares. Técnica agora será testada com gado Nelore, a raça mais produzida no Brasil!
A Embrapa Gado de Leite, em parceria com a Universidade de Juiz de Fora, anunciou recentemente a criação de um aplicativo que além de fazer a identificação de vacas pelo rosto, também avalia seu estado de saúde. Chamado de Happy Cow ID, o software usa visão computacional e aprendizado de máquina. Segundo os criadores, isso substituiria os brincos e chips por um sistema mais rápido e preciso.
A pecuária do futuro já vem fazendo experimentos para viabilizar a identificação individual de animais em campo com o uso de imagens, o que tornará obsoletos os brincos, as tatuagens e as marcas utilizadas para esse fim. A tecnologia é semelhante ao reconhecimento facial, frequentemente usado em grandes aeroportos para encontrar criminosos. É um sistema convencional de câmeras instaladas em campo, cochos ou até mesmo em drones, que podem capturar imagens para identificar cada animal em poucos segundos.
Em entrevista ao site Ag Evolution, a Embrapa revelou que o aplicativo tem previsão de lançamento para 2022 e estará disponível para produtores do mundo todo. De acordo com Bruno Carvalho, pesquisador da Embrapa Gado de Leite, foram aplicadas técnicas de processamento de imagens e visão computacional – deep learning – e redes neurais artificiais.
Os cientistas tiveram sucesso com a raça pantaneira. Utilizando redes neurais convolucionais (CNN), o estudo recorreu a três modelos de arquitetura de redes neurais para a identificação do gado pantaneiro.
O trabalho foi liderado pelo cientista da computação Fabrício de Lima Weber, durante o mestrado na Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul (UEMS). Weber afirma que, além do bem-estar animal, uma das vantagens do sistema de identificação por imagem é a economia. “As marcas auriculares usadas hoje são importadas e a taxa de câmbio do dólar tem estado bastante instável. O agricultor que usa esse sistema também precisa comprar o leitor para decodificar o código impresso nas marcas auriculares. Quando um animal perde a etiqueta no pasto, ela precisa ser substituída ”, detalha o especialista.
“O sistema baseado em imagens vai agilizar os embarques de animais e a emissão de GTAs [guia de porte de gado]”, explica Weber, já vislumbrando a abertura da Rota Bioceânica, que ligará o Brasil ao porto do Chile e facilitará o embarque gado para a Ásia. Estudos anteriores já haviam avaliado aferir o peso dos animais por meio de imagens de suas costas.
Como funciona?
A tecnologia é como o cérebro humano, ela funciona com aprendizado profundo e redes neurais. O software “aprende” conforme é exposto aos animais, então ele começar a criar padrões. O pesquisador revelou ao Ag Evolution que eles direcionaram o modelo para aprender características nos rostos dos animais.
“Após essa etapa, o modelo receberá imagens de novos indivíduos e classificará automaticamente o seu estado de saúde”, explicou.
Para ajudar no “aprendizado” do aplicativo, eles estão convidando os produtores de leite a enviarem imagens de suas vacas. Clique aqui para enviar a sua foto.
Vantagens aos produtores
A nova tecnologia promete permitir maior facilidade e controle do rebanho. Ela também vai facilitar a identificação dos animais e também a administração da fazenda. Isso porque será possível armazenam em computadores ou smartphones todas as informações captadas.
É uma alternativa mais barata aos já conhecidos brincos e chips, que exigem a compra de bastões de leituras de códigos impressos no brinco para seu funcionamento. “Um sistema de câmeras torna possível identificar cada vaca com rapidez e precisão, evitando qualquer estresse ou lesão aos animais”, revelou o profissional da Embrapa.
Os pesquisadores acreditam que o aplicativo esteja disponível aos produtores em 2022. A ideia é que ele seja acessível a todos os usuários, mas ainda não se ele será gratuito.
27.000 imagens
Os vídeos coletados foram analisados e divididos em 212 vídeos menores, dos quais foram extraídos os frames que continham as imagens dos animais para formar o banco de dados com 27.849 imagens do gado pantaneiro.
As três arquiteturas apresentaram taxas de precisão que variaram de 98,87% a 99,86% e tempo de processamento da imagem de 13 horas e 14 minutos (mínimo) e 54 horas e quatro minutos (máximo). Esses cálculos ocorreram em duas etapas: aprendizado de máquina, quando captura e processa as imagens para a criação de um banco de dados; e validação, quando imagens desconhecidas são adicionadas às máquinas para reconhecimento e identificação.
Após o sucesso do experimento com o gado pantaneiro, Abreu relata que a próxima etapa será pesquisar algoritmos que permitam desenvolver a mesma técnica para identificar imagens do gado Nelore, que é a raça de corte mais representativa do Brasil.
Antes, porém, Weber pretende desenvolver um aplicativo para que a identificação do gado pantaneiro estudado apareça em breve na tela do celular.
“Se o agricultor está em uma feira agrícola, por exemplo, ele pode acessar os dados de um animal pelo app e conhecer a história da raça, por exemplo, informações adicionais de um banco de dados”, exemplifica o cientista da computação. Ele ressalta que o gado pantaneiro é considerado ameaçado de extinção e os projetos em andamento visam a sua conservação in situ.
Criador de gado Nelore: “ O sistema seria um sonho!”
O pecuarista Leonardo de Barros, da Fazenda Santa Clara, no Pantanal no entorno do município de Nhecolândia (Corumbá-MS), afirma que esse sistema de identificação com imagens seria “um sonho”. “Se houvesse uma forma de transmitir o dados via bluetooth diretamente para o computador, sem digitar ou escanear nada, seria um sonho ”, afirma.
Segundo ele, os brincos que identificam os animais apresentam algumas dificuldades. “Às vezes não lê direito, o bicho perde o brinco, tem que reaplicar. Isso sem falar no estresse de conter os animais para fazer essa identificação ”, explica Barros.
O pecuarista diz que compra marcas auriculares pelo menos duas vezes ao ano e entre 7% e 8% dos aparelhos acabam perdidos no campo, o que compromete os dados. Ele também está confiante de que o sistema baseado em imagens garantiria o bem-estar dos animais. “Hoje, com o sistema de brinco, o animal precisa ser contido pelo menos três ou quatro vezes ao longo de sua vida. Temos que detê-los para colocar a etiqueta e, novamente, para ler os dados. Isso estressa os animais e pode machucá-los. ”
Outro risco é a ocorrência de doenças em decorrência da perfuração da orelha. “Uma mosca pode pousar lá e trazer larvas para a região. Então você tem que curar. O sistema de imagem traria enormes vantagens ”, reafirma.
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A expectativa de Barros é que os dados captados pelas imagens possam ter efeitos comerciais, pois permitiriam a rastreabilidade com informações precisas sobre cada cabeça de gado. “Imagine uma maneira de saber quando aquela vaca deu à luz, quando foi desmamada, os cuidados que recebeu. Eu gostaria muito de ter esse sistema na minha fazenda ”, declara o agricultor.
Sua única preocupação diz respeito ao custo de instalação do sistema de câmeras. “Posso imaginar que não deva ser muito barato, mas tem que ter funcionalidade”, diz. No entanto, para ele, a identificação por meio de imagens teria “tantas vantagens que [ele] não consegue nem começar a descrever”.