Presidente da John Deere Brasil destaca que o agro se transformou por completo em 50 anos e as mudanças seguirão, catalisadas pelo ambiente de inovação
Dizer que o Brasil tem vocação para ser o celeiro do mundo está longe de significar que somos um país atrasado, rural. Muito pelo contrário. E o que não faltam são indícios de que o campo hoje é, mais que um celeiro de alimentos, um celeiro de talentos e de inovação.
Para se ter uma ideia, em 1970, a participação do setor no Produto Interno Bruto (PIB) era de 7,5%. Era de se imaginar que, após 50 anos de desenvolvimento da nossa indústria e do setor de serviços, o agro correspondesse a uma fatia ainda menor da nossa economia. Porém, ocorreu justamente o contrário: fechamos 2020 com nada menos que 26,6% do PIB vindo do campo.
Não foi só isso que mudou. Antes, tínhamos que importar alimentos para dar conta da demanda interna. Agora, não apenas produzimos o bastante para todos os brasileiros como também alimentamos cerca de 800 milhões de pessoas mundo afora – o agronegócio, inclusive, corresponde a quase metade das exportações brasileiras.
O fato é que o agro se desenvolveu tanto quanto (ou ainda mais que) outros setores. Esse atual patamar é resultado de uma notável trajetória que combina avanço tecnológico, investimento em pesquisa e programas de incentivo. E posso dizer que tive o privilégio de testemunhar essa evolução, visto que, em muitos aspectos, ela coincidiu com pontos da minha própria jornada.
Nasci e cresci em um vilarejo chamado São João da Reserva, no interior do Rio Grande do Sul. Naquele início dos anos 1960, o trabalho na lavoura, ainda mais em uma pequena propriedade familiar, era extremamente pesado, sem a menor qualidade de vida e apoio oficial para prosperar. E mesmo tendo apenas 12 anos, eu já havia notado que o futuro ali não era muito promissor.
Decidi então entrar para um colégio agrícola em Pelotas, um internato onde eu teria cama, comida e, após sete anos, o título de técnico agrícola. O contato com todo aquele conhecimento me fez me dar conta de algo: havia muito o que aprender sobre a terra – e as coisas podiam ser melhores do que eu havia conhecido na propriedade da minha família.
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Anos mais tarde, na década de 1980, já graduado em engenharia agrícola, tive a oportunidade de passar um tempo estudando na Alemanha, a fim de conhecer a tecnologia de lá e ver como poderíamos aplicar aquele conhecimento técnico no Brasil. Na época, dizia-se que tínhamos uma defasagem de 30 anos em relação ao maquinário agrícola do primeiro mundo.
Porém, um dos meus professores na ocasião me deu uma lição que jamais esquecerei. Ele disse: “Não se impressione com a nossa tecnologia. Isso, mais cedo ou mais tarde, vocês terão. Com uma fita métrica, um cronômetro e um polegar, você conseguirá medir tudo o que medimos aqui.”
“Por meio da mecanização, agricultura de precisão, conectividade e engenharia genética, aumentamos a produção agrícola em mais de 500%, ao passo que a área cultivada cresceu apenas 60%, o que mostra que é, sim, possível produzir, preservar e prosperar” Paulo Herrmann
O polegar, para ele, representava o bom-senso: esse movimento de pinça quase exclusivo do ser humano e que nos permitiu criar tantas ferramentas que nos permitiram lidar melhor com a natureza. Naturalmente que isso foi uma metáfora.
Mas a moral da história é que não nos bastava importar tecnologia apenas por importar; ela precisava fazer sentido em nosso contexto tropical. Então mais do que olhar para fora, o desafio era olhar para dentro: o que nós precisávamos – e que botões nossos polegares precisariam apertar para resolver isso.
Outro assunto que atormentava a todos os jovens na época era o chamado malthusianismo, a teoria criada pelo economista britânico Thomas Malthus, segundo a qual a produção de alimentos cresceria em progressão aritmética (PA), ao passo que a população cresceria em progressão geométrica (PG). Isso significa que, em algum momento, atingiríamos um ponto de inflexão no qual não teria alimentos para todos.
Sou grato por poder dizer que, passados 40 anos, isso não aconteceu. Muito pelo contrário. Nossas máquinas agrícolas hoje não deixam nada a desejar em relação às do primeiro mundo: temos mais tecnologia em um trator do que tinha a Apollo 11, que levou e trouxe de volta o homem à Lua.
Por meio da mecanização, da agricultura de precisão, da conectividade, e da engenharia genética, aumentamos a produção agrícola em mais de 500%, ao passo que a área cultivada cresceu apenas 60%, o que mostra que é, sim, possível produzir, preservar e prosperar.
Toda essa transformação exige sólidas pontes entre os diferentes agentes desse ecossistema. Nestes novos tempos, inovar é condição de existência, e não mais um diferencial de poucos. Academia e iniciativa privada têm atributos complementares e absolutamente compatíveis para construir em conjunto não o futuro, mas o presente, que se transforma a cada minuto.
Se antes os jovens deixavam o campo em busca de oportunidades, hoje vemos o agro como uma grande possibilidade de carreira, pronto para abraçar os desafios de um futuro que nos exigirá produzir ainda mais alimentos e tomar conta do meio ambiente. Isso, na verdade, já é uma realidade que ganha cada vez mais escala.
Costumo dizer que eu estudei porque, quando olhava para trás, via uma enxada correndo atrás de mim. Mas as coisas mudaram muito: antes, se você não estudasse, ia parar na lavoura. Hoje é o contrário: para parar na lavoura, você precisa estudar.
Fonte: Revista Globo Rural